Há coisas que acontecem de uma hora para outra, sem que estejamos preparados para tanto. Na maioria das vezes, eventos desse tipo são bastante negativos. Nos remoemos para tentar compreender e colocar ordem no caos trazido de repente, mas é em vão. A incompreensão só faz aumentar a dor e o sofrimento. Mas por que o fluxo da existência haveria de se importar em deixar claro para nós acontecimentos que por mais que estejam atrelados à nossa experiência, independem de nossa vontade e ação?
A mente humana é dotada de uma tendência natural que sempre busca explicações, busca a ordem, busca organizar os dados e montar o grande e contínuo quebra-cabeças que compõe as experiências de vida de cada um. Esse é um aspecto da natureza, e é também aquilo que nos torna humanos e que nos fez evoluir das cavernas em direção ao mundo de hoje. Interpretado de maneira errada, tal aspecto faz muitas vezes com que o ser humano se encha de orgulho e se coloque no pedestal da superioridade em relação aos demais seres sencientes. Soberba que desmorona diante do simples acaso, diante do inesperado.
A você leitor, acostumado com minhas defesas em favor da racionalidade e da ciência, pode parecer estranho estar lendo isso. Ocorre que a ciência tem seu escopo e é realizada com o objetivo, pelo menos quando os bons cientistas não desprezam a ética, de nos trazer benefícios em escala planetária. A ciência tem as suas perguntas próprias, seus métodos específicos e suas conclusões que devem nos ajudar em algum sentido, dependendo de seu entendimento e aplicação corretos. A ciência não pode e nem intenta responder a tudo. Há mistérios que permanecem, algo que os bons cientistas também reconhecem. Isso nos fornece uma lição de humildade em contraponto ao especismo antes mencionado. Algumas experiências, fundadas com base em teorias totalizantes, tentaram em certos momentos da história aplicar um caráter supostamente científico a cada milímetro da vivência humana. Só poderia ter terminado da pior forma. Mas deixemos isso para lá.
Eu citei os mistérios que estão além da compreensão humana e é isso que me faz escrever hoje. Pudera, uma vez que o inesperado trouxe a mim nestes últimos dias algo gerador de muita dor e sofrimento. Não foi a primeira, nem a última vez. Pensar dessa forma, bem como tentar encontrar amparo em fórmulas projetadas pela religião ou pela autoajuda, é confortável para quem está fora da situação, mas para quem a vivencia, não satisfaz. A mim pelo menos, nunca satisfez, nem tampouco ofereceu consolo.
Por sorte, sou cercado de pessoas muito boas e sua simples presença já é uma ajuda das mais preciosas. Além disso, as reflexões filósoficas também podem servir para que melhor encaremos o sofrimento em momentos como esses.
Por sorte, sou cercado de pessoas muito boas e sua simples presença já é uma ajuda das mais preciosas. Além disso, as reflexões filósoficas também podem servir para que melhor encaremos o sofrimento em momentos como esses.
A impermanência de tudo aquilo que nos cerca é uma realidade. Também é fato que tudo pertence à totalidade que é o universo e tudo retorna a ele e a um novo ciclo de existência. Dessa forma, é correto pensar que a impermanência é, na verdade, apenas a perpetuação de um fluxo que mantém o todo do universo. Esse é outro ponto que igualmente serve para nos transmitir humildade. O universo não considera nossas individualidades, nem os laços afetivos que formamos por nossa conta e responsabilidade durante a experiência vivida. Estamos na maioria do tempo envolvidos no turbilhão de nossos pensamentos, acreditando em ilusões e pouco prestamos atenção em sinais que fugazmente passam diante de nosssas vistas.
A infinitude do universo vem se perpetuando ao longo de éons, eras e períodos. O infinito está também presente em termos de tamanho. Quantos bilhões de galáxias! O que há nelas? Qual é a nossa missão aqui? E a missão de outros seres sencientes? Quantos e quais são os planos de existência? Não sabemos. O certo é que não somos nada diante de tanta imensidão temporal e espacial. Nossa grandeza está no fato de que somos partes desse todo.
No mais, uma convicção: quem não posso ver agora, e que me causa um grande vazio, mais cedo ou mais tarde, em um ou outro lugar do espaço-tempo, estará presente novamente. Obrigado Mitsy!