No que se refere às últimas discussões observadas sobre a questão que envolve os direitos dos animais, - e logo de início deve-se deixar claro que tais direitos, sempre que considerados por quem procura respeitá-los, são vistos como uma obrigação da racionalidade humana para com outras criaturas sencientes - é importante derrubar um certo tipo de argumento que, embora rasteiro e totalmente incoerente, aparece de modo recorrente nas discussões acerca do tema.
Todos aqueles que por algum motivo não se importam com a ética em relação aos animais adotam uma postura contraditória sempre que tentam analisar a questão alçando o ser humano a uma condição de suposta superioridade. Estranhamente, essa superioridade assume contornos que muitas vezes desembocam em um rebaixamento do mesmo ser humano que se procurou privilegiar no bojo da argumentação especista. O homem tem direito de fazer o que bem entende com os animais não-humanos? A justificativa dos que respondem positivamente à pergunta tem como cerne a ideia segundo a qual o ser humano, por possuir um cérebro que lhe concede maior capacidade de pensamento racional, é capaz então de dominar a natureza cujas imposições as outras criaturas não conseguem modificar, ao contrário do próprio homem. Nisso a condição humana seria superior e daria direito ao domínio sobre as demais criaturas. Antropológica e biologicamente, é possível contestar esse entendimento: o homem não é o mais forte dentre os animais, nem o mais veloz, nem o melhor nadador, além de não ser capaz de voar. O desenvolvimento da cultura permitiu ao ser humano a capacidade de transformar o ambiente natural, mas a cultura é dinâmica, noção que não se pode perder de vista porque nem sempre as transformações são positivas e também porque a permanente interação do homem com o meio implica na necessidade de mudanças que devemos empreender de acordo com aquilo que a racionalidade e a ética indicam como sendo mais acertado. O homem produz cultura, no entanto, não se situa em um plano externo à natureza, pelo contrário, pertence a ela. Se somos racionais, o que antes de ser um indicativo de superioridade subjetiva é um sinal de diferença objetiva, devemos usar a razão a fim de mantermos uma simbiose com o meio natural e não simplesmente para tratá-lo de maneira irresponsável, ao bel-prazer, sem ética, sem prudência, sem respeito.
Defender uma relação utilitarista sobre a natureza alegando que o estado natural não conhece a ética, como advoga o sr. Luiz Felipe Pondé, além de não enxergar que o atributo ético é uma construção cultural e capaz de oferecer ao homem, nisto sim, um ângulo privilegiado de observação ontológica, peca por ser um raciocínio fortemente incoerente: primeiro coloca o ser humano no pedestal de uma superioridade abstrata e vazia, mas no fim o arrasta para o primitivismo selvagem: o leão caça a zebra, assim como o homem faz testes, confina, mata e come. Afinal, ele considera a espécie humana superior ou igual às demais criaturas? De maneira diferente dos animais não-humanos, entre os quais as ações instintivas excluem a possibilidade de agir fora das determinações do próprio instinto, não possuímos a capacidade de racionalizar, ponderar e fazer escolhas? Lembrando novamente que o dever ético é humano.
Os estudos históricos apontam que muitas vezes, em suas experiências mundanas, o homem relativizou a ética, sendo diametralmente oposta a lição de grandes líderes como Buda ou Jesus Cristo, homens de princípios éticos universais e inabaláveis. O culturalismo relativista, o desprezo para com os padrões acumulados desde os tempos mais remotos, bem como a soberba em relação ao conhecimento do passado, preferindo-se apostar no atípico, no marginal ou no improviso, caracteriza atitude comum de escolas filosóficas que sempre estiveram do lado errado. Ao sr. Luiz Felipe Pondé, que se julga de direita, mas que em se tratando do tema em questão se comporta como um cético esquerdista, afirmo que sou um conservador moral e estou com os animais; quem se contradiz é ele.