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quinta-feira, 14 de março de 2013

O fantasma de Chávez


Nos últimos seis ou sete anos o mundo foi sucessivamente se vendo livre de certos personagens públicos portadores de ideias políticas totalmente execráveis. Se o velho ditado "vaso ruim não quebra" pode ser aplicado a uma verdadeira múmia como Fidel Castro, o mesmo não vale para Saddam Hussein, Osama Bin Laden, Muamar Kadafi, Kim-Jong-il, Eric Hobsbawm, Oscar Niemayer e agora também, Hugo Chávez, o último a entrar para a galeria dos defuntos bem-vindos
Dentre estes, importa menos o legado que permanecerá com relação a Hobsbawm e Niemayer, já no que se refere aos demais, o desaparecimento de suas formas individuais não é capaz, a curto e médio prazo, de levar embora as heranças nefastas que eles deixaram. Eis aí o problema.
O chavismo é hoje uma realidade concreta na Venezuela, tendo até mesmo se espraiado, com algumas variações, para outros países da América do Sul, mas sempre mantendo as mesmas características gerais: populismo, autoritarismo, terceiro-mundismo, centralismo de governo, estatismo econômico, messianismo e segregacionismo social, aspectos diretamente relacionados ao pensamento da velha esquerda latino-americana. É no cadinho e no turbilhão de tais elementos que o governo de Chávez ainda deixará muitos resquícios no país vizinho, mesmo após sua morte.
As instituições democráticas da Venezuela, ou o pouco que delas existia antes até do advento chavista, atualmente não passa de algo absolutamente inexistente. Quanto tempo até que uma nação as possa erigir novamente, não se sabe, pois isso depende de vários e complexos fatores. A única certeza é que leva tempo, bastante tempo. Campanhas políticas de cartas marcadas, oposição em franco prejuízo, plebscitos que reduzem drasticamente a riqueza do debate democrático e intensa propaganda governamental jamais podem ser apontados como aspectos de evidência democrática, mas tão somente como vetores do solapamento da democracia, coisa óbvia que os defensores do chavismo não sabem enxergar. Em democracias de fato e de direito é impossível e desnecessária a existência de uma liderança tida como infalível e salvadora sobre a qual toda a tecitura política do corpo social é depositada, arranjo que delega toda e qualquer atividade política a essa mesma liderança e resulta na anomia do cidadão. Esse é o terrível legado do chavismo no campo político, cuja sentença final acaba sendo o ódio dirigido contra aqueles que não concordam em compactuar com um sistema que anula a democracia. Por um paradoxo típico de governos autoritários, aqueles que lutam para permanecer na condição de sujeitos históricos são estigmatizados como "inimigos da causa", ao passo que os apoiadores, dos quais se retira a condição de atores da política por meio da cooptação e da propaganda, atribui-se o status falso de protagonistas de um drama histórico que nunca pode conceber nem sequer o mínimo de liberdade.
No terreno econômico, o qual vale frisar que não se dissocia do político, mas atua em compasso com ele, a centralização gera como produto uma torrente avassaladora de desperdício do dinheiro público. Não surpreende o sucateamento progressivo da PDVSA ao longo do governo de Chávez. O estatismo não permite concorrência exatamente pelo fato de ter necessariamente de colher os benefícios para o próprio governo, bancando gastos homéricos com armas, assistencialismo e propaganda, pilares sem os quais um sistema autoritário não se mantém vigente. O estado, continuamente, investe dinheiro em sua máquina gerando um círculo vicioso que o faz se avolumar e concentrar poder em detrimento do corpo social, ludibriado com políticas assistencialistas que ao invés de erradicarem a pobreza, a tornam um recurso cuidadosamente administrado e explorado pela burocracia governamental. É neste nicho que a cooptação deita raízes. Na concepção da velha esquerda, o mercado da concorrência, vetor da precificação e da busca pela excelência dos produtos, é confundido de forma propositada com a avidez empresarial. Omite-se a apreciação segundo a qual aqueles que se locupletam da ausência de concorrência são os membros da burocracia e os empresários ligados a ela. Estes são os que transformam em privado aquilo que é público. Economias que operam a partir destas bases funcionam mal, invariavelmente, todavia isto não é problema para um estado que está sempre a reverter o dinheiro público para seus cofres. A degradação dos meios urbano e rural na Venezuela não é fruto do acaso quando se considera as políticas econômicas de cunho chavista. Esta é a realidade concreta do chavismo e o seu triste legado.
Dentro de pouco tempo os venezuelanos irão às urnas e a oportunidade de começar a romper com o chavismo tem um nome: Henrique Capriles. Não será fácil, entretanto, para o incansável opositor de Chávez, já que agora terá de enfrentar um Nicolás Maduro que herdou as estruturas de poder de seu antecessor, inclusive o direito imposto de concorrer no pleito. Que espaço terá Capriles em sua campanha? Até que ponto Maduro irá se aproveitar da martirização de Chavéz e do culto à personalidade messiânica do caudilho? Até que ponto a população venezuelana será capaz de exorcizar os efeitos da cooptação que sofreu nos últimos quinze anos? Ela terá o desejo de se livrar de tal fardo? As respostas destas perguntas guardam consigo o futuro da Venezuela. Por ora, ele é extremamente imprevisível. Só duas certezas: o fantasma de Chávez é perigoso..., mas Chávez morto, aumentam as chances de uma Venezuela melhor.

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