Conforme o tempo passa, sinto menos reconhecimento e identificação com o mundo em que vivo. Sinto tal impressão em vários episódios e situações, sejam aqueles, de duração mais curta, ou essas, mais afeitas à conjuntura.
Os acontecimentos recentes na Uniban me fizeram pensar uma vez mais na questão. Num programa de debates da MTV Brasil, o presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), que participava da mesa, afirmou que universidades do tipo possuem um caráter muito autoritário, pois encerradas em seu ranço mercantilista, criam das catracas para dentro, um mundo à parte, no qual os "fiscais de disciplina", os bedéis, vigiam os estudantes em cada passo, nem mesmo permitindo a existência de CA´s, grêmios ou jornais internos. Ele pode ter razão em parte do que disse, mas não creio ser esse o foco do problema. Não posso deixar de observar que uma tal colocação se prende ao economicismo rasteiro, típico de um presidente da UNE. O caso não ocorreu por ter sido no interior dos muros da Uniban, mas revela algo que se processa no próprio mundo em que vivemos, faz parte do modo de agir e da visão de mundo de inúmeros jovens de nossa sociedade. Não que estaria dando conta de uma boa análise sobre o tema, longe disso, mas teria sido bem mais simples se ele dissesse que o perfil de alguns alunos que frequentam universidades desse tipo, não é lá muito interessante. Exigiria mais coragem, logo, é mais fácil atacar a instituição, por sua impessoalidade.
Não vou discutir a qualidade do ensino na Uniban, já frequentei uma universidade análoga e a estrutura é péssima, apesar dos altos valores cobrados na mensalidade. Essas instituições praticam uma espécie tupiniquim de capitalismo de fundo de quintal. Não primam pelo aspecto qualitativo, previdente e de longo prazo, estando interessadas somente no lucro do dia seguinte, indo desde as próprias mensalidades, até o pirulito vendido na cantina. Repito, não é esse o foco, nem posso aceitar a ideia de que o caso de Geisy Villa Nova tenha se passado por conta de excesso de autoritarismo na Uniban, pelo contrário, pois se houvesse um zelo maior pela disciplina, o que não é justamente o caso de capitalistas dos trópicos, teriam conversado com a aluna no sentido de orientá-la a respeito da inadequação de seus trajes para um ambiente acadêmico, evitando que se chegasse aos absurdos subsequentes. O caso não foi uma consequência derivada das particularidades que desqualificam a Uniban em vários aspectos. Problemas mais graves do que esse, de outra ordem, mas com forte semelhança de fundo, já ocorreram nas mais conceituadas universidades do país. Os trotes violentos, sempre acontecem aqui ou ali, basta lembrar da morte do calouro de medicina da USP, Edison Tsung-Chi Hsueh, em 1999. Toda vez que me lembro desse rapaz e de sua família, me dá vontade de chorar.
É preciso deixar claro que o que se passou na Uniban, se deveu, repito, à doença das massas em nossa sociedade contemporânea. Vivemos num mundo de total e completa desmesura. Não há valores, não há virtudes, tem-se a noção inglória de que isso diz respeito aos tolos e caretas. Não há parâmetros para se julgar o certo e o errado, o que não possibilita referências para condenar aquilo que não é devido, que é atroz. Não existem limites, essenciais, para que a liberdade consciente possa ser estendida a todos. Talvez não haja nada mais distante do nosso mundo do que o elemento centrípeto da liberdade, tão bem conceitualizado por Irving Babbitt.
Nada havia de valor ou ideologia naquilo que Geisy sofreu, mesmo valores ou ideologias que pudessem ser qualificadas como as mais vis, injustas e cruéis. Um grupo de senhoras católicas extremamente radicais, se lhes fosse possível, poderia chegar ao ponto, se estivéssemos em outras eras, de queimar Geisy na fogueira. Horripilante, deplorável, decerto, mas ao menos por conta de uma concepção religiosa, de uma visão de mundo. Os estudantes que gritaram vitupérios, palavras obscenas e odiosas à Geisy, não possuem qualquer ideologia ou a mais tosca visão de mundo que seja. Estavam exercendo aquilo que os antropólogos conhecem bem e que pode-se denominar de "propensão à violência grupal em situações de exceção", ainda que essa exceção não fosse mais do que o vestido curto e o jeitão provocante da aluna ofendida. Os agressores, desprovidos de qualquer senso de polidez, ponderação, justiça ou tolerância, como tantas pessoas numa sociedade incapaz de julgar com propriedade e sensatez, porque desvirtuadas, agiam no mais cruento instinto selvagem hobbesiano. Sem dúvida nenhuma, Geisy teria sido estuprada se os agressores não fossem contidos. Os jovens não estavam condenando a vítima pela inadequação de seus trajes, mas colocando-se no direito de violentá-la por considerarem-na uma prostituta. Muitas pessoas de nosso mundo já não atribuem nenhum valor naquilo que elas próprias poderiam cultivar como suas próprias qualidades, quanto mais são capazes de enxergar qualificativos que façam incidir algum tipo de generosidade ou tolerância para com os outros.
Incrível ainda, o fato de que até mesmo mulheres estavam envolvidas na violência contra Geisy. É um paradoxo de causar o mais profundo espanto que num país que se gaba à exaustão dos atributos físicos de suas mulheres mais típicas, pessoas do sexo feminino tenham mantido uma postura tão execrável. Outro absurdo é que, de modo geral, as jovens brasileiras pouco notam os problemas que uma cultura tão voltada para a mulher-objeto possa trazer a elas próprias. Desmesura dos nossos tempos, será possível ao menos atenua-lá?!
Os acontecimentos recentes na Uniban me fizeram pensar uma vez mais na questão. Num programa de debates da MTV Brasil, o presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), que participava da mesa, afirmou que universidades do tipo possuem um caráter muito autoritário, pois encerradas em seu ranço mercantilista, criam das catracas para dentro, um mundo à parte, no qual os "fiscais de disciplina", os bedéis, vigiam os estudantes em cada passo, nem mesmo permitindo a existência de CA´s, grêmios ou jornais internos. Ele pode ter razão em parte do que disse, mas não creio ser esse o foco do problema. Não posso deixar de observar que uma tal colocação se prende ao economicismo rasteiro, típico de um presidente da UNE. O caso não ocorreu por ter sido no interior dos muros da Uniban, mas revela algo que se processa no próprio mundo em que vivemos, faz parte do modo de agir e da visão de mundo de inúmeros jovens de nossa sociedade. Não que estaria dando conta de uma boa análise sobre o tema, longe disso, mas teria sido bem mais simples se ele dissesse que o perfil de alguns alunos que frequentam universidades desse tipo, não é lá muito interessante. Exigiria mais coragem, logo, é mais fácil atacar a instituição, por sua impessoalidade.
Não vou discutir a qualidade do ensino na Uniban, já frequentei uma universidade análoga e a estrutura é péssima, apesar dos altos valores cobrados na mensalidade. Essas instituições praticam uma espécie tupiniquim de capitalismo de fundo de quintal. Não primam pelo aspecto qualitativo, previdente e de longo prazo, estando interessadas somente no lucro do dia seguinte, indo desde as próprias mensalidades, até o pirulito vendido na cantina. Repito, não é esse o foco, nem posso aceitar a ideia de que o caso de Geisy Villa Nova tenha se passado por conta de excesso de autoritarismo na Uniban, pelo contrário, pois se houvesse um zelo maior pela disciplina, o que não é justamente o caso de capitalistas dos trópicos, teriam conversado com a aluna no sentido de orientá-la a respeito da inadequação de seus trajes para um ambiente acadêmico, evitando que se chegasse aos absurdos subsequentes. O caso não foi uma consequência derivada das particularidades que desqualificam a Uniban em vários aspectos. Problemas mais graves do que esse, de outra ordem, mas com forte semelhança de fundo, já ocorreram nas mais conceituadas universidades do país. Os trotes violentos, sempre acontecem aqui ou ali, basta lembrar da morte do calouro de medicina da USP, Edison Tsung-Chi Hsueh, em 1999. Toda vez que me lembro desse rapaz e de sua família, me dá vontade de chorar.
É preciso deixar claro que o que se passou na Uniban, se deveu, repito, à doença das massas em nossa sociedade contemporânea. Vivemos num mundo de total e completa desmesura. Não há valores, não há virtudes, tem-se a noção inglória de que isso diz respeito aos tolos e caretas. Não há parâmetros para se julgar o certo e o errado, o que não possibilita referências para condenar aquilo que não é devido, que é atroz. Não existem limites, essenciais, para que a liberdade consciente possa ser estendida a todos. Talvez não haja nada mais distante do nosso mundo do que o elemento centrípeto da liberdade, tão bem conceitualizado por Irving Babbitt.
Nada havia de valor ou ideologia naquilo que Geisy sofreu, mesmo valores ou ideologias que pudessem ser qualificadas como as mais vis, injustas e cruéis. Um grupo de senhoras católicas extremamente radicais, se lhes fosse possível, poderia chegar ao ponto, se estivéssemos em outras eras, de queimar Geisy na fogueira. Horripilante, deplorável, decerto, mas ao menos por conta de uma concepção religiosa, de uma visão de mundo. Os estudantes que gritaram vitupérios, palavras obscenas e odiosas à Geisy, não possuem qualquer ideologia ou a mais tosca visão de mundo que seja. Estavam exercendo aquilo que os antropólogos conhecem bem e que pode-se denominar de "propensão à violência grupal em situações de exceção", ainda que essa exceção não fosse mais do que o vestido curto e o jeitão provocante da aluna ofendida. Os agressores, desprovidos de qualquer senso de polidez, ponderação, justiça ou tolerância, como tantas pessoas numa sociedade incapaz de julgar com propriedade e sensatez, porque desvirtuadas, agiam no mais cruento instinto selvagem hobbesiano. Sem dúvida nenhuma, Geisy teria sido estuprada se os agressores não fossem contidos. Os jovens não estavam condenando a vítima pela inadequação de seus trajes, mas colocando-se no direito de violentá-la por considerarem-na uma prostituta. Muitas pessoas de nosso mundo já não atribuem nenhum valor naquilo que elas próprias poderiam cultivar como suas próprias qualidades, quanto mais são capazes de enxergar qualificativos que façam incidir algum tipo de generosidade ou tolerância para com os outros.
Incrível ainda, o fato de que até mesmo mulheres estavam envolvidas na violência contra Geisy. É um paradoxo de causar o mais profundo espanto que num país que se gaba à exaustão dos atributos físicos de suas mulheres mais típicas, pessoas do sexo feminino tenham mantido uma postura tão execrável. Outro absurdo é que, de modo geral, as jovens brasileiras pouco notam os problemas que uma cultura tão voltada para a mulher-objeto possa trazer a elas próprias. Desmesura dos nossos tempos, será possível ao menos atenua-lá?!
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