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domingo, 2 de maio de 2010

Trinta e três


Jesus Cristo morreu com 33 anos. Alexandre, O Grande, também. Mesmo entre aqueles que não são cristãos, como é o meu caso, a sabedoria de Jesus o faz, reconhecidamente, um dos maiores mestres que a humanidade já produziu. Os dogmas do catolicismo, especialmente, e de modo lamentável, imputaram à figura de Cristo uma condição ridícula ao distorcerem a seu bel-prazer e interesse uma história de propósito e serena sabedoria.
Ademais, Jesus Cristo não precisa de quem o defenda, uma vez que já possui seu devido e merecido reconhecimento. Com Alexandre, O Grande, já é diferente. Em termos militares, seu gênio é lembrado, no entanto, quando se trata da pessoa humana, é associado com a crueldade e a com a megalomania. Certa vez, assistindo a uma aula de Literatura, a professora se referiu a Alexandre como um "grande FDP", exatamente nesses termos. Considerei tal julgamento absolutamente falho, tanto do ponto de vista histórico, como do espiritual. Alexandre nunca lutou por questões materiais, mas sim pela honra e pela glória, duas ideias sem as quais não é possível entender o universo mental e espiritual dos antigos gregos. Ainda que os meios pelos quais Alexandre empreendeu suas ações possam ser passíveis de críticas, tal pensamento é anacrônico e anti-histórico. Além do mais, é preciso enxergar que Alexandre foi um homem desprendido e que sempre manteve firme um propósito.
Hoje, grande parte das pessoas vive inteiramente e obsessivamente em função da realização de desejos. No senso comum, desejos conferem felicidade. Nada poderia ser mais ilusório e mais catastrófico segundo o que ensinam as grandes tradições filosóficas, de Buda e Confúcio, passando pela Grécia Antiga e chegando ao Cristo anterior ao cristianismo. A felicidade jamais poderá ser encontrada em meio externo ao sujeito, pois ela é um estado de espírito fruto de uma percepção aguçada do mundo que nos cerca. A felicidade é uma questão de desprendimento e de propósito.
O senso comum acredita também que uma pessoa feliz está sempre de bom humor, sorridente e vendo graça em tudo. O simplismo que envolve essa ideia é o mesmo que não permite enxergar além do superficial, incapaz de perceber que o cotidiano é só uma capa que recobre o âmago profundo do conhecimento e que torna alguém apto a manter um propósito e o desprendimento que o mesmo requer. Obviamente, o ser humano necessita do trabalho e do lazer mundano, esses elementos secundários que perfazem uma parte da experiência e que geram prazer. Prazer, não felicidade. É saudável ter hobbies, mas esses não tornam ninguém mais feliz.
Os mais jovens são aqueles que mais se iludem e que mais perdem tempo correndo atrás de seus desejos. A vida é um tanto cruel nesse aspecto, uma vez que rouba momentos preciosos e fugazes da existência humana, que insiste em ser desperdiçada na mão da tenra juventude. Como uma vez disse George Bernard Shaw, a juventude é uma coisa maravilhosa, pena que seja desperdiçada com os jovens. Quando se é jovem, a vida parece um extenso cardápio de guloseimas cuja indecisão quanto à melhor escolha apenas torna o deleite e a brincadeira mais gostosos. A juventude é um grande barato, a vida toda em aberto e de sorriso largo. Quando a idade adulta chega, porém, a vida parece se encurtar bruscamente. Não é de surpreender que quase todo mundo viva a dizer que o tempo voa ou que há falta de tempo, o que é logicamente um absurdo, pois o tempo é infinito. A sensação de fechamento e de corrida contra o relógio que acompanha o passar dos anos se deve ao fato de que muitas daquelas escolhas da juventude já foram feitas e, ao se fazer uma escolha, obrigatoriamente as outras opções são descartadas. Todavia, e isso é o mais importante, o homem de conhecimento, desprendido e possuidor de propósito, sabe que uma escolha é só uma escolha no curso do caminho que o próprio propósito permite trilhar. Só o propósito importa, de modo que as escolhas são feitas com responsabilidade e desprendimento. Não se lamenta uma escolha, mas se lida com ela, não há remorso ou arrependimento, mas sim um trabalho de reflexão em torno das possibilidades que uma escolha traz. Não se olha para trás, mas segue-se no curso do propósito, que é um meio, mas um fim ao mesmo tempo. O propósito é espera e paciência (o tempo é infinito), mas é também vivência e experiência.
O conhecimento é o propósito e é ele que torna possível maravilhar-se com aquilo que nos cerca, pois é o único modo de ver que ao mesmo tempo em que não se é nada, se é tudo, que o tudo é nada e que o nada é tudo.

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