Nas palestras que proferiu à TV polonesa e, posteriormente publicadas na Gazeta Wyborcza, o grande filósofo Leszek Kolakowski colocou as seguintes palavras sobre a questão do poder:
"As ferramentas que o povo tem para o controle do poder nunca são excelentes, as mais eficazes que a humanidade inventou até o momento para impedir uma tirania arbitrária são, precisamente: manter as ferramentas de supervisão do poder pela sociedade e limitar a abrangência do poder do país àquilo que é de fato essencial para que a ordem da sociedade seja preservada. Querer regular todas as áreas de nossas vidas, afinal de contas, é o que faz um poder totalitário."
Para Kolakowski, que não acreditava na anarquia, tampouco na democracia direta, assim como eu também não acredito, os grifos (feitos por mim) indicam claramente a defesa dos mecanismos de representatividade que, em uma sociedade livre, servem exatamente para impedir a concentração de poder nas mãos de um déspota, de um grupo partidário, ou do próprio Estado, aviltado institucionalmente por tal grupo, sendo este último caso, na melhor tradição gramsciana, precisamente o que ocorre no Brasil (des)governado pelo PT. Desde já, vale destacar que em uma sociedade cuja vida política corre dentro da normalidade, nada mais recomendável do que o apreço pelas instituições. Entretanto, considerando-se o caso brasileiro, no qual estamos muito longe de um regime político preservador da liberdade, é mais válido ainda indagar se nossas instituições podem prestar algo benéfico à população. A resposta é claramente negativa.
Em uma recente querela envolvendo nomes conhecidos da direita brasileira, todos eles obviamente opositores do petismo, observou-se ferrenha discordância no que toca aos caminhos a serem tomados para que o PT seja devidamente alijado do poder que ora ocupa no âmbito federal. De um lado, aqueles que não enxergam possibilidades na via institucional, de vez que a mesma encontra-se totalmente destruída pela cooptação sistemática, - importantíssimo salientar, nesse sentido, que trata-se de uma situação que abrange esferas externas à própria política, notadamente a cultura e as mentalidades, tendo inclusive aí sua origem - e de outro, os que defendem a substituição do governo por meio daquilo que está previsto na Constituição, isto é, o impeachment. A despeito do fato de que, no momento em que vivemos, cisões entre aqueles que se opõem ao PT se mostrarem prejudiciais a todos que não podem mais suportar tamanho estado de calamidade ao qual a nação foi conduzida pelo partido de Lula e José Dirceu, devo afirmar que, a meu ver, a primeira perspectiva, está absolutamente correta. Se não é possível que o poder seja eliminado por completo - para quem não crê em anarquia - no Brasil de hoje, é algo que precisa ser reinventado: o Estado brasileiro não apenas não oferece rigorosamente nada que preste ao cidadão, como também suga quase metade dos rendimentos do trabalhador; além disso, no âmbito da política, os mecanismos de representatividade têm se apresentado extremamente deficientes, pois não existem partidos de direita que possam diversificar os discursos e não há quase ideias em discussão, mas tão somente arranjos escusos em torno dos joguetes de poder, problema que atinge partidos e quadros concomitantemente, um reflexo da cooptação gramsciana.
O impeachment, como já opinei em outro artigo, poderá ter efeito simbólico significativo, mas jamais será suficiente para sanar um quadro metastático de doença da máquina pública, ainda por cima, consubstanciado em função da própria sociedade que, se hoje em dia finalmente se deu conta, em sua maior parte, do significado nefasto representado pelo PT e pelo esquerdismo em geral, ainda está longe de ser capaz de pensar em termos de liberalismo político-econômico e conservadorismo moral.
Tudo se complica ainda mais porque, se o impeachment carece de alcance e abrangência, nem mesmo um saneamento completo do Estado e um processo de mudança na cultura e na mentalidade poderão garantir o futuro próspero pelo qual anseia o cidadão. Em primeiro lugar, porque isso leva tempo, no mínimo cerca de três décadas, em segundo, porque não se tem até agora o substrato necessário, traduzido justamente por um pensamento orientado na direção de valores políticos, econômicos, culturais e morais capazes de alterar a rota.
A teoria do Estado patrimonialista, sobre a qual Bolívar Lamounier vem insistindo com rigor científico e habilidade intelectual, é uma realidade em nosso país, tanto histórica, dada sua própria formação desde D. Pedro I, como política e cultural, incutida cada vez mais na mente do povo pela doutrinação de esquerda e tornada avassaladora pela organização criminosa que nos comanda - ao contrário do poder supervisionado e limitado pela sociedade, o petismo se caracteriza pela intensa concentração de poder em torno do partido com vistas à perpetuação, sem se fazer de rogado no solapamento das bases democráticas - pelo contrário, já que essa é sua razão de ser. O Estado patrimonialista não só se torna muito maior do que a própria sociedade, como faz dela um corpo fragilíssimo na missão de colocar peias ao poder estatal, elemento propiciador de liberdade. É um arranjo inteiramente antiliberal e gerador de intensa desigualdade política.
O grande desafio da população brasileira é como mudar essa situação, não somente pensando em tirar o PT do poder, mas já vislumbrando um panorama pós-PT. Há um alento no fato de que hoje, como coloquei anteriormente - e várias pesquisas de opinião têm mostrado - a maior parte das pessoas já identificou a verdadeira face demoníaca do PT, todavia, é nítido também que muito pouca gente sabe como combatê-lo com as armas da argumentação e das ideias políticas, tampouco possui noção dos princípios básicos de cultura necessários para organizar uma sociedade livre, próspera e bem protegida da tirania. Quem forma opinião será, cada vez mais, responsável na proposição de novos caminhos.
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