Protected by Copyscape Original Content Checker

sábado, 3 de março de 2018

O caso de Rodolpho Branco


No primeiro semestre de um curso universitário de Humanas, pode-se encontrar basicamente quatro tipos de calouros: 1) aquele que ali está porque anteriormente teve sua mente moldada de acordo com os ditames da ideologia esquerdista dominante, sendo que a universidade é apenas um prolongamento do que ele já julga conhecer [de todos os tipos, esse é o que tem mais chance de completar o curso, ainda que muitas vezes demore anos a fio para tanto, levando-o aos trancos e barrancos, sem compromissos com estudos na acepção do termo e exercendo dentro do campus uma militância política truculenta e de cunho intelectual altamente imbecilizado]; 2) aquele que não sabe ao certo porque escolheu estar ali, se mostrando perdido, deslocado e sem nenhum rumo [de forma mais geral, o aluno que se enquadra nessa classificação desiste do curso antes mesmo de terminar o segundo semestre]; 3) aquele que ingressa no curso em busca de conhecimento e da formação de uma visão de mundo profunda, de um propósito de realização intelectual baseada na construção de ideias a partir da interlocução com uma ampla diversidade de autores, inclusive e sobretudo com os que não são alinhados aos cânones acadêmicos, tais quais Marx, marxistas e derivações, como a Escola de Frankfurt [este grupo compõe uma minoria silenciosa e confidencial com boas chances de concluir a graduação, mas é obrigado a travar uma luta interna quase que diária contra o próprio ambiente universitário que, se não estiver respaldada em grande força espiritual, logo faz o esforço soçobrar e 4) aquele que faz o curso com objetivos estritamente pragmáticos, ou seja, se formar para possuir um diploma de nível superior, um tipo bastante raro nas Humanas, mas ainda assim verificável.
Rodolpho Branco, rapaz de seus 17 ou 18 anos, silhueta rotunda e atarracada, compunha um perfil curioso que não se enquadrava totalmente em nenhuma das quatro categorias acima listadas. Talvez o segundo tipo fosse o mais próximo de sua figura pessoal, mas embora perdido em grande medida, ele mantinha algum grau de politização típico do primeiro tipo, contudo, lhe faltavam o engajamento e a disposição para a ação direta que caracterizam o militante de esquerda, além disso, ele também não fazia a menor questão de propagar cotidianamente o beabá daquela turma, sendo que não possuía nem sequer o parco repertório da marxologia. Branco era um largado que, vez por outra, soltava despreocupadamente algum clichê esquerdista, sem nenhum objetivo político, sem nenhum compromisso estratégico. Para se ter ideia, já em termos de visual, um elemento importante na composição do estereótipo do militante esquerdista, Branco desviava totalmente do padrão com seu boné, bermudão largo, comprido e tênis de skatista. Evidentemente, em seu íntimo, ele não gostava nem um pouco dos Estados Unidos, mas de maneira contraditória, assim como todos que renegam a cultura ocidental, a democracia verdadeira e a defesa incondicional da liberdade, seus atos e costumes entravam em choque com as ideias, todas elas deformadas e bizarras.
Nas rodinhas de conversa Branco rapidamente revelava aos convivas suas ridículas idiossincrasias, próprias de um espírito dos mais pobres. Certa vez ele contou com orgulho que havia causado vômito - descrevendo até mesmo os detalhes do mesmo - no irmão pequeno de uma namorada após lhe fazer cócegas incessantes. Em outra ocasião, discutindo a respeito de música, afirmou que Ronnie James Dio era desprezível porque não evoluía, que Rock Progressivo era um estilo burguês (outro exemplo dos clichês de esquerda que ele escutava e reproduzia sem realizar análise e julgamento próprios) e também que qualquer barulho poderia ser considerado musicalmente válido. Ora, se qualquer barulho é música, então como ele poderia proferir desqualificações a artistas e estilos musicalmente bem mais elaborados do que barulho, apenas pelo fato de não apreciá-los?! Para Branco, certamente, o barulho do irmão da namorada vomitando era mais interessante que música de qualidade.
Em um dos últimos episódios dos quais me recordo de Branco destilando sua sapiência, discutia-se sobre a ditadura militar no Brasil e ele, obviamente precisava dar a demonstração de conhecer alguma coisa em relação ao assunto  (todo indivíduo que entra em um curso de Humanas, mesmo que não esteja preocupado em manter qualquer compromisso amplo e de prazo que vá além dos quatro anos regulares, se sente na necessidade de articular algum palavrório acerca de questões que perfazem o arcabouço básico do metiê): lá pelas tantas, declarou: "era uma época em que minha mãe comia arroz com limão!" Se a mãe de Branco era pobre à época da ditadura, teria ela se recuperado economicamente na década de 1980, período de hiperinflação? Deveras improvável. Talvez um pouco mais para frente, quando da estabilização monetária dos 1990. Mais crível. Em algum momento a família de Branco, ou quem quer que fosse que lhe oferecia respaldo financeiro, venceu a penúria da fase dos milicos, só assim para ele usar tênis Vans... Bem que ele poderia ter criticado a ditadura em seu aspecto político, ou melhor ainda, se falasse do sucateamento do Banco Central, um dos fatores geradores da hiperinflação, que aí sim fez muita gente comer arroz com limão depois que o governo havia se tornado novamente civil, mas isso já seria exigir muito da capacidade de nosso estranho rapaz.
A aula de Teoria da História I realizava-se aos sábados pela manhã, uma inesperada e involuntária forma de selecionar pessoas em se tratando de um ambiente esquerdista. Qualquer um que não levasse aqueles momentos de acordo com a mais pura seriedade, com o mais profundo interesse e com o mais esmerado esforço não poderia chegar a lugar nenhum em termos de conhecimento e formação como historiador. Ali, desde as primeiras palavras enunciadas por aquela professora, criatura que apareceu como uma espécie de Providência para quem estivesse interessado em enfrentar os desafios que ela propunha sem precisar torná-los abertamente manifestos e só os revelando tacitamente, confidencialmente, nas recônditas entrelinhas, ficava estabelecido às mentes virtuosas que um caminho estreito e difícil estava se abrindo, um caminho que deveria obrigatoriamente ser precorrido caso os presentes quisessem buscar algo a mais. Em um desses sábados olhei para Branco e o vi desenhando absorto nas últimas páginas do caderno, língua dobrada no canto da boca, como quem se dedica a uma tarefa, lápis e borracha nas mãos para traçar e dar acabamento a um tipo de grafite desses que se observa em muros públicos... O mundo caía ao seu lado, e ele ali, se divertindo, como se não houvesse nada além do seu desenho.
Branco não durou dois semestres na faculdade, nunca mais o vi, nunca mais soube nada dele. A pequena parte de sua história aqui narrada está longe de ser um caso de horror à moda de Charles Dexter Ward, mas não deixa de ser um caso bizarro e, a seu modo, perturbadoramente assustador.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Lixo acadêmico - uma experiência (e um pouco de análise)


Em minha graduação, eu frequentava regularmente a faculdade no período da manhã para cursar o Bacharelado, mas já a partir do terceiro semestre, dei início à Licenciatura, cujas aulas ocorriam à tarde ou à noite, dependendo da disciplina.
No quarto semestre eu me matriculei no curso que levava o nome de Estrutura e Funcionamento da Educação Básica (uma inutilidade do começo ao fim, apenas para encher linguiça e grade curricular), o que demandava ir à faculdade uma vez por semana no turno da noite, se não me falha a memória, às terças-feiras. Com o passar do tempo, o nome da professora me fugiu completamente e apenas lembro que se tratava de uma gordona meio insondável, distante, cujos modos passavam a impressão de que, exceto pelos elementos puramente mecânicos e ideológicos, ela não sabia exatamente qual era seu papel ali. Claro, porém, que ela não fazia cerimônia em deixar transparecer sua concepção política de esquerda. Havia um aluno chamado Legnaro que era o queridinho dela, um rapaz bem articulado em relação ao palavrório revoltado, típico de palanque, que é comum a todo marxista. Legnaro se mostrava extremamente ligado na aula, participativo, complementava quase tudo que a professora colocava como argumento e ela, claro, aprovava com um largo sorriso e comentários elogiosos. Em muitos momentos, se alguém chegasse à sala de aula, caso não fosse pelo fato de que Legnaro sentava-se na carteira e ela na cadeira que acompanhava a mesa do professor, iria pensar que quem ministrava a aula era ele ao invés dela.
Para se ter uma ideia da monotonia daquele curso, os diálogos entre a professora e Legnaro eram o que de mais interessante acontecia, não, evidentemente, porque oferecessem reflexões a serem aproveitadas, mas devido ao fato de que observá-los um concordando com o outro e, por parte dele, a tentativa bem sucedida de obter a aprovação dela, compunham cenas que beiravam o cômico, apesar de serem trágicas.
Tem-se aí um exemplo simples e corriqueiro do pensamento único de manada que domina completamente um curso de Humanidades nas academias brasileiras. O sujeito treina o linguajar mais típico de um revolucionário comuna e rapidamente se torna capaz de despejar a manjada e rasteira meia dúzia de palavras de ordem contra a burguesia, o capitalismo e a propriedade privada. O marxismo é um instrumento eficaz de doutrinação porque seu corpo teórico, embora relativamente extenso no que tange a aspectos econômicos, cabe em poucas frases de efeito naquilo que tem de mais sedutor frente a jovens tolos e revoltados, que é seu elemento político, de sentido mais imediatista e que não requer nenhum apuro filosófico, nenhuma concepção elaborada sobre a história ou sobre a complexidade das relações humanas.
Assistir às conversas da professora com Legnaro era sem sombra de dúvida um espetáculo de tragicomédia, pois a coisa funcionava como se ambos estivessem com todo o discurso completamente pronto e acabado, apenas aproveitando aqueles momentos para exteriorizar o "conhecimento" na direção da plateia amestrada, tal qual o mesmo fosse fruto de uma força arrebatadora, indiscutível, elevada ao mais alto grau de magnanimidade. Os demais alunos apenas deveriam absorver aquele bálsamo emanado de duas pessoas iluminadas, muito acima dos simples mortais. Era patético e me causava ânsia de vômito, mais ainda em função de que a maioria dos alunos realmente se mostrava boquiaberta diante do enlatado repertório, como se fosse algo inovador, como se estivessem frequentando um rito de iniciação, prestes a adentrarem ao mundo da sabedoria marxista, redentora da humanidade. Detalhe: discursos como aqueles eu escutava como um moto perpétuo desde o Ensino Fundamental II, chamado de Ginásio à minha época. Enganar trouxas no interior de um ambiente supostamente qualificado em termos de intelectualidade é a coisa mais fácil nesse Brasil, mas mais ridículo do que isso é o fato de que quem se propõe a enganar é tão trouxa como aqueles que engana!
Se no período matutino o ambiente universitário já era contaminado pelo pensamento único de esquerda, durante a noite, a coisa se tornava mais acentuada, mais aterradora, mais potencialmente inebriante para mentes frágeis, vazias, carentes de individualidade, de imaginação, de poder de escolha e de propósitos nobres, propícias portanto a servir de repositório para aquele catecismo profano. A atmosfera pesada e sufocante que fui obrigado a vivenciar por quatro anos e mais especialmente durante o quarto semestre é algo que não sou capaz de descrever com toda a propriedade que a tarefa exige. Resta somente que o leitor procure imaginar um local um tanto quanto mal cuidado, iluminado aquém do que se faz necessário em ambiente que deveria ser de estudos, povoado por muitas figuras caricaturais, como por exemplo, um sujeito usando boina e cavanhaque angulado, fumando cannabis e dissertando em tom professoral, expressão corporal altiva e repleto de gestos -  talvez tentando imitar a postura de Lenin em cima de um palanque - sobre o Estado e a revolução.
Esse é, salvo certas exceções em termos de instituições e cursos, o ambiente acadêmico brasileiro de onde saem os "especialistas" Fake News, os sociólogos e tutti quanti que aos trancos e barrancos se formam na mais rasteira marxologia para depois serem convidados a falar sobre assuntos que não dominam nem no nível dos rudimentos (viram Pedro Abramovay e Alba Zaluar emitindo opiniões a respeito da intervenção na Segurança Pública do RJ?). Esse é o ambiente acadêmico que reproduz a chusma de homens-massa sem um pingo de alta cultura, como adiantou José Ortega Y Gasset há noventa anos, fedelhos que desconhecem todo e qualquer pensador que não esteja alinhado à doutrinação (até mesmos os alinhados eles conhecem mal e porcamente), mas que não têm vergonha de gritar baboseiras para quem quiser ouvir.
O Brasil só mudará com uma profunda renovação da intelectualidade. E isso, se vier a acontecer, demorará centenas de anos.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Um curso com Noel Remo


Volto hoje depois de muito tempo com um conto que remete a determinado episódio de minha época de graduando. Em breve, escreverei mais uns dois ou três com o objetivo de retratar os absurdos e as agruras enfrentados no curso de História. Não há dúvida de que alunos universitários espalhados pelo Brasil afora se veem diante de situações semelhantes àquelas que vivi e, dependendo de seu caráter, de sua orientação política e do grau de compromisso que colocam para si próprios, encontram grande dificuldade em aceitar situações que, para outros - pouco ou nada afeiçoados pela busca do conhecimento -  são vistas como normais ou mesmo passam bastante desapercebidas. Depositar altas expectativas em algo que deveria naturalmente ser sério e levado com a mais esmerada responsabilidade, muitas vezes, pode ser absolutamente frustrante.
O nome verdadeiro do personagem do conto foi modificado por questões éticas - não que ele merecesse esse respeito, pelo contrário, mas ética é algo que se tem ou não, independente do sujeito ou do objeto envolvidos. Boa leitura!
***
O professor Noel Remo entrou na sala de aula, olhou com alguma dose de desdém e arrogância para os alunos que o aguardavam e começou a arranhar um portunhol arrastado e difícil de ser compreendido. Suas calças, com a barra pela canela, e os calçados, alguma coisa entre um sapato meio cano e um coturno, somados ao aspecto geral de sua pessoa, causavam uma impressão bizarra. Alunos, inevitavelmente, julgam pela aparência. Muitas vezes erram redondamente, em outras, a própria bizarrice, aos poucos, vai se revelando o menor dos males... . Ele ministrava a disciplina História Contemporânea - não me lembro mais se Contemporânea I, II, III..., me recordo apenas que o primeiro texto - e um dos únicos minimamente trabalhados por ele - tinha R. H. Tawney como autor.
Após decorridas algumas aulas Remo propôs uma espécie de seminário que deveria ser realizado a partir de um conjunto de textos previamente selecionados por ele. A atividade era em grupo e nosso texto foi... o Manifesto do Partido Comunista! Àquela altura - deveria estar no 5° semestre, algo assim - eu passava por uma espécie de catarse quando me deparava com escritos de Marx. Desde o início do curso, as overdoses cavalares do barbudão de Trier eram recorrentes até mesmo em disciplinas nas quais a ementa pouco ou nada tinha a ver com alguma coisa saída da pena daquele que ensejou a fina definição de Raymond Aron, "o marxismo é o ópio dos intelectuais". Marx não me assustava mais, não me surpreendia em nada, eu já sabia a essência de suas ideias, já conhecia bem a sua linguagem e a maneira pela qual ele tendia sempre a simplificar o mundo e as relações sociais. Não posso negar que foi positivo ter lido Marx à exaustão; quanto mais eu o lia, quanto mais o estudava, quanto mais submetia seu pensamento ao teste da realidade histórica e social, mais me afastava dele, mais me tornava ávido em refutá-lo. É claro que eu ainda não dominava por completo a crítica ao marxianismo/marxismo, missão que até hoje faz parte de meu roteiro intelectual (autores críticos de Marx e de suas ideias não fazem parte do rol bibliográfico acadêmico), ainda assim, já naquela época eu havia descoberto leituras extremamente proveitosas, um pouco por sorte, um pouco porque eu sempre estivera atento às raríssimas brechas que de vez em quando se abriam no claustro de esquerdismo e anti-capitalismo que me sufocavam no cotidiano de aluno universitário. Posteriormente, atuando de forma autônoma, fui ampliando continuamente meus conhecimentos em relação à crítica de Marx, aspecto que, devo confessar, muito me orgulha.
Voltando ao seminário, expusemos o assunto e fizemos as devidas considerações diante de um impassível Remo que, durante todo o tempo de exposição, limitou-se a proferir as seguintes palavras: "podem falar mal de Marx, podem falar mal dele". Nenhum membro do grupo havia dito nada desabonador acerca do autor do texto, pois apenas estávamos procurando deslindar os elementos internos do mesmo, sem lugar, pelo menos até aquele momento no qual fomos bruscamente interrompidos, para julgamentos ad hominem (embora muitos possam ser aplicados no caso de Marx). Indignado, mas quieto, fiquei pensando que Remo, possivelmente, tivesse prestado bastante atenção à minha expressão facial blasé, afinal, como um marxista poderia conceber que um aluno seu se mostrasse desprovido de qualquer empolgação ao tratar do hiperbólico e colérico Manifesto?! Ou, por outro lado, minha postura talvez fosse o reflexo da própria falta de originalidade e de apuro bibliográfico e historiográfico por parte do professor..., contudo, além de mim, outros alunos nem tão avessos a Marx estavam apresentando o seminário junto comigo. No fim, Remo não atribuiu nota alguma ao seminário.
Isto posto, o foco deste conto não é Marx, mas sim Noel Remo. A disciplina por ele ministrada foi algo tão inútil, tão sem substância, tão superficial, que as poucas lembranças advindas de suas aulas são tragicômicas. Modestia à parte, eu fui um excelente aluno universitário e, mesmo quando um professor ou a matéria me desagradavam, situação comum em vista da insistência enfadonha de muitos professores em torno dos mesmos temas, clichês, conclusões ridículas, do maniqueísmo entre os bons (os esquerdistas portadores de uma missão redentora) e os maus ("os porcos burgueses capitalistas" e os "alienados", "os mantenedores do status quo opressivo e dominador"), minha dedicação não deixava de existir e não foi diferente com o próprio Remo.
Em determinado momento do curso, ele aplicou uma avaliação em relação à qual não tive grandes dificuldades. Os critérios de avaliação eram totalmente subjetivos: MB (muito bom), B (bom), R (regular), RU (ruim). Essa sopa de letras era ainda mais problemática à medida que precisava ser convertida em uma média de zero a dez que representaria a média final na disciplina. Tirei "B", mas o que representava um "B"? Um 7.5, segundo raciocínio lógico-matemático, porém, nada que se referisse a Remo possuía teor lógico.
Mais para o fim do curso, outra avaliação e, desta feita, atingi um "MB". Tratava-se de um 8, de um 9.5, de um dez? Como traduzir aquele vago conceito em um número? Nem mesmo Remo tinha resposta para tal pergunta.
O curso chegou ao seu final, um alívio para mim! Como era chato e maçante ouvir aquele sujeito, que não demonstrava nenhuma nobreza de espírito ao dar aquelas aulas, nenhum contentamento, que não realizava o mínimo esforço para trazer um autor diferente, para ensaiar uma linha de raciocínio alternativa que fugisse do marasmo acadêmico esquerdista. Remo, então com 76 anos de idade, só se entusiasmava nos momentos em que alunas se debruçavam sobre sua mesa no intuito de dirimir alguma dúvida ou simplesmente trocar com ele palavras ao vento. Certa vez ele tocou no braço de uma aluna e disse: "ahh, olha aqui, um fiozinho do meu bigode na sua roupa". Sim, ele fez isso, chegou a esse ponto!
Quando fiz a consulta eletrônica de meu boletim, eis que lá constava na disciplina de Remo a nota 5. Obviamente, eu não entendi como poderia ter levado um 5 se nas avaliações obtive "B" e "MB". Será que ele havia detestado o seminário a respeito do Manifesto? Mas como, se nem ao menos atribuiu uma nota ou sequer fez algum comentário que não aquele já mencionado? Não, as coisas não estavam batendo! Que raio de cálculo o cretino fez?! Cálculo?
Fui obrigado a pedir a famigerada Revisão de Nota. Dias depois da requisição, uma funcionária do departamento liga em minha casa (uma funcionária!) informando que Remo, face ao pedido, havia solicitado um trabalho sobre o programa de seu curso. Lá fui eu para o computador munido do tal programa - que o professor não cumprira em quase nada, mesmo em se tratando de um roteiro trivial - para fazer o trabalho. Entreguei no prazo estipulado e, decorrido mais um tempo, em nova consulta ao sistema, verifiquei que minha média tinha subido para 8, com o quê me dei por satisfeito. Era preciso encerrar com aquilo, virar a página!
Anos se passaram e comecei a pensar que o fato dele ter solicitado o trabalho depois de ter atribuído uma média sem pé nem cabeça foi um grande absurdo, afinal, eu não deixei de cumprir as obrigações e a incongruência era toda da parte dele. Que raio de cálculo o cretino fez?! Cálculo? O cara era um perfeito idiota! Um perfeito idiota latino-americano, esse personagem tão bem descrito e analisado por Plínio Apuleyo Mendoza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa, praga mais comum em um curso de Humanidades!
Até hoje não me conformo em ter sido tão trouxa ao aceitar fazer o trabalho! Deveria ter batido o pé, soltado os cachorros, gritado aos quatro ventos que ele estava totalmente equivocado, que ele tinha obrigação de rever uma média atribuída sem critério nenhum! Revisão de nota significa que uma média obtida deve ser revisada a partir do que já foi avaliado erradamente!
Como tão bem trouxe à baila Yuri Vieira, a vida acadêmica no Brasil é uma tragédia! E ainda tem gente que se orgulha de um diploma e acredita que com isso vira intelectual e adquire o direito de opinar a respeito de tudo, ... e com o máximo de pedantismo!

segunda-feira, 17 de abril de 2017

"Todos são iguais" e o Estado que eles querem


Depois da chamada "Delação do fim do mundo", mais um episódio que colocou na berlinda proeminentes e idolatradas figuras políticas da esquerda brasileira, vários adeptos da sinistra ideologia desde já estão procurando juntar os cacos na tentativa de reerguer seus bandidos de estimação.
É claro que a coisa toda chegou a tal ponto que os esquerdistas não podem mais simplesmente blindar e defender diretamente quem os representa - até mesmo Vladimir Safatle deu uma criticada em Lula - tendo restado somente a estratégia segundo a qual "todo mundo é podre", "todo mundo é igual" ou "não foi o PT que inventou a corrupção". Juca Kfouri, sociólogo uspiano (um dos inúmeros antros de formação e disseminação de ideias esquerdistas, falidas e geradoras de miséria econômica e opressão política), aproveitou novamente uma de suas colunas esportivas para dar pitaco em política, afirmando a respeito do embate Moro vs. Lula - na verdade não um simples confronto entre dois agentes individuais, mas sim um vis a vis representativo da oposição entre todo cidadão de bem, trabalhador de verdade, honesto e pagador de impostos, aviltado pelo Estado e pela classe política contra justamente um Estado infestado de discurso, espírito e práticas tipicamente esquerdistas, um Estado agigantado, totalmente ineficiente na prestação de serviços, um Estado sanguessuga e que nada oferece em troca, um Estado que, aparelhado pela ideologia e pela politicagem mais rasteira, visando somente o poder pelo poder, não tem peias em roubar cifras imensuráveis do erário público, um Estado que desde a Constituição de 1988 adota a famigerada retórica dos "benefícios e conquistas sociais", do "desenvolvimentismo", do "coletivismo", do pobrismo e da vitimização para, no fundo, se estabelecer como um "Estado camarão", segundo a formulação de Bolívar Lamounier, patrimonialista e que faz a sociedade lhe servir - que o mesmo "poderia ser evitado se não fossem os erros de muitas décadas". Para Kfouri, evidentemente cínico e mal intencionado, os erros teriam sido evitados se o PT fosse alçado ao poder antes de 2002, de tal forma que haveria então mais tempo para estruturar o Estado como ora se apresenta, portanto, mais tempo para a esquerda se aproveitar dele sem que os escândalos viessem à tona com tamanha força.
Na ótica dos esquerdistas o PT é vítima do sistema, pois este o corrompeu e o fez se distanciar de suas diretrizes originais. Pura balela, pura falácia! O PT nunca mudou a essência de seu cerne ideológico. Essa gente é tão pervertida que a partir de agora pretende lavar as mãos na própria sujeira com o objetivo de dar a entender que o lamaçal no qual se encontra o país é fruto das políticas de seus opositores. Nesse sentido, o fabianismo esquerdista do PSDB e o pragmatismo situacionista do PMDB, aliado do PT e sem o qual este não teria se mantido no poder por 13 anos, são "neoliberais", "de direita", "conservadores" e outras baboseiras do mesmo quilate.
Enquanto oposição, o PT se colocava como detentor único e ilibado da ética e da justiça, composto por quadros dotados da mais iluminada "consciência social" (vide acreditar na luta de classes e na suposta desigualdade social gerada pelo capitalismo), portadores de uma visão de mundo superior (entenda-se marxismo), conhecedores da fórmula infalível para erradicar os males do presente e instaurar um Futuro perfeito (a revolução, antes proletária, hoje cultural) - nada mais antiliberal. O mesmo PT que, nas palavras de José Dirceu, um de seus maiores mentores intelectuais, "não rouba e não deixa roubar"... e que depois de permanecer no poder durante 13 anos, pobrezinho, foi cooptado pelos abutres malfeitores, tendo se tornado "igual a todos os outros", o que serviria como uma espécie de vingança e de lição de moral contra "a classe média paneleira" que só atacou os petistas. "Viram só? Não éramos APENAS nós"! Quanto cinismo daqueles que não apenas não moveram uma palha para barrar a corrupção, como fizeram dela um mote!
Não é necessário mais uma vez esquadrinhar que a concepção de Estado esquerdista é inexorável quanto aos resultados que ora vivenciamos, não é necessário pela enésima vez mostrar por A+B que a corrupção foi estabelecida como modus operandi, como prática de governo sob a égide do PT, não é necessário repetir ad aeternum que todo o aparelhamento esquerdista, tanto no âmbito da política, quanto também fora dela - fator importantíssimo - foi programada desde um bom tempo de caso pensado para minar o dissenso e infectar por dentro o frágil e incipiente sistema democrático brasileiro. O mais desalentador é observar que o discurso da esquerda ainda é capaz de confundir a muitos e que assim ela se renova debaixo das fuças dos desavisados. É assim que os Kfouris já estão mexendo pauzinhos para passar a ideia de que eles não têm nada a ver com isso.
Em teoria, Marx propusera o fim do Estado, mas obviamente, e por vários fatores que excedem este artigo, foi incapaz de precisar quanto tempo levaria para que tal ocorresse, até porque em sua obra inexiste uma análise histórica do Estado e do sistema parlamentar. Calejados pela complexidade da realpolitik e também pelas vantagens que dela se pode obter, os continuadores de Marx, desde a Revolução Russa e até hoje se mostram como ferrenhos defensores da atuação estatal sobre a economia e sobre as vidas dos indivíduos. Reformar o Estado brasileiro de modo a torná-lo enxuto, eficiente, não-interventor, bem menos burocrático e livre daquela surrada ideia sempre exaustivamente presente em períodos eleitorais, de acordo com a qual, para que a democracia exista e se mantenha, basta votar - e cujo resultado é eleger políticos estatólatras que se locupletam  da máquina pública- é algo completamente fora de questão para esquerdistas, afinal, o Estado que aí está é o seu sonho de consumo há um século.

sexta-feira, 24 de março de 2017

O brasileiro: um grande problema. O maior problema.


"Não há nada mais perigoso no mundo do que um idiota persuadido de sua normalidade" - Olavo de Carvalho

O problema do Brasil não é econômico, nem político. O problema do Brasil é cultural, é de mentalidade. O problema do Brasil é o brasileiro. O brasileiro é um perfeito idiota latino-americano.
O brasileiro ainda não sabe que o atual governo se originou do governo do PT.
O brasileiro ainda não sabe que sem o PMDB o PT não teria ganho as eleições de 2014, nem de 2010.
O brasileiro ainda não sabe que o PMDB é um partido de centro ESQUERDA (bem como o PSDB, social-democrata, fabiano, em franco antagonismo com princípios liberal-conservadores).
O brasileiro pensa que esquerdismo é paz e amor e que ser de direita significa ser malvado.
O brasileiro ainda não sabe que treze anos de descalabros econômicos, administrativos, de corrupção sistêmica, de total aparelhamento de TODAS as esferas públicas e de interesses partidários e ideológicos colocados acima de qualquer virtude de governança republicana não podem ser recuperados em dez meses. Talvez nem em mais treze.
O brasileiro compartilha charge esquerdista atacando o "neoliberalismo" como fonte de todos os males sem saber que quem lhe rouba todos os dias é o Estado.
O brasileiro, mesmo de modo inconsciente, quer mais Estado sem saber que o Estado, além de lhe roubar, não oferece nem mesmo o básico.
O brasileiro não sabe que quanto maior a presença do Estado e maior o seu tamanho, menor é o grau de liberdade politica e maior é o potencial de corrupção.
O brasileiro execra a classe política, mas mesmo assim não se despe de sua estatolatria.
O brasileiro enxerga e pensa o Estado praticamente como uma entidade metafísica e benfeitora, administrada por criaturas angelicais, como certa vez colocou João Pereira Coutinho.
O brasileiro não sabe que a aliança espúria entre governo e empresas que não querem competir no mercado e ganham privilégios do próprio governo em troca de propina é um arranjo tipicamente anticapitalista.
O brasileiro não sabe o que é uma pirâmide etária. O brasileiro não sabe o que é expectativa de vida, nem que ela tem aumentado. O brasileiro não sabe que a taxa de crescimento vegetativo tem diminuído. O brasileiro não conhece rudimentos matemáticos. O brasileiro não sabe que não existe uma conta individual para cada trabalhador no INSS. O brasileiro não sabe que sua "contribuição" (na verdade, um imposto) ao INSS é gasta pelo governo assim que ele a paga para sustentar um contingente cada vez maior de aposentados. O brasileiro nunca reivindicou o fim das "contribuições" em prol de um sistema livre e privado.
Agora que, bem ou mal, o atual governo, com todos os seus defeitos oriundos exatamente da mentalidade estatólatra e esquerdista, ainda assim toma medidas tímidas, mas que contribuem um pouco com a melhora do quadro socioeconômico, o brasileiro débil mental, idiota útil, analfabeto em todos os sentidos, tomado pelo discurso falso, equivocado e hipócrita do esquerdismo, grita ridiculamente contra o que lhe pode trazer certos benefícios a médio e longo prazos, conferindo assim, ganho político para o PT.
O brasileiro, por sua ignorância, por sua preguiça intelectual, pela falta de apreço com relação à leitura e ao conhecimento e por sua incapacidade de discernimento entre o certo e o errado, bem merece sofrer o que tem sofrido há tanto tempo.

*PS: antes que alguém se sinta ofendido pelo teor generalizante, tomo como base de análise o brasileiro médio; se a carapuça não lhe servir, não faça questão de vesti-la; também sou brasileiro.

sábado, 18 de março de 2017

Os tais direitos


Em seu livro imprescindível, A rebelião das massas, José Ortega Y Gasset foi ao ponto quando afirmou que o homem das sociedades de massa, esse homem contemporâneo, que se debate na vã tentativa de encontrar um lugar no mundo sem olhar para dentro de si, sem saber qual o significado da liberdade e de onde ela vem, é um homem que apenas reivindica direitos esquecendo-se de que para tê-los, alguém necessariamente precisa concedê-los. Somente clamar por direitos deixando de reconhecer deveres conduz a sociedade de massa a uma anomalia na qual inexiste qualquer nobreza de propósitos.
Onde, além da massificação contemporânea, as pessoas padecem da falta de apreço pelo conhecimento e mergulham em um estado contínuo, letárgico e modorrento de ignorância quase tido como natural, a situação é ainda pior.
É um paradoxo que no presente hi-tech da contemporaneidade, o homem massificado e ignorante viva em um estado no qual a cultura mal consegue se diferenciar da natureza, um quase retorno aos primordiais tempos em que prevaleciam largamente a lei do mais forte e o puro instinto. Sempre que imerso no desespero da sobrevivência sem propósitos e na carência do bem-estar que o cultivo do intelecto é capaz de conferir, qualquer farolete de luz, mesmo que leve a paragens nada aprazíveis, irá servir como orientação (e provocará, inexoravelmente, a catástrofe). As seitas que descobriram essa fraqueza na mente do homem das sociedades de massa obtiveram sucesso na divulgação, na disseminação e na implantação de regimes políticos cuja promessa de resolver todas as questões humanas, aqui e agora, como num passe de mágica, seduzem facilmente uma turba de ignorantes. A propaganda de massas é a chave para conquistar as pessoas por seus corações.
Talvez a coisa mais difícil para alguém imbuído de boas intenções seja convencer um incauto de que há quem o esteja enganando da maneira mais pérfida possível. É extremamente trabalhoso do ponto de vista psicológico refletir e estar constantemente reexaminando os próprios pensamentos, sobretudo se não são autônomos, se foram enxertados e transmitidos de modo a propor que não é preciso muito mais do que delegar esperanças (mesquinhas) e a consecução dos tais direitos a uma liderança autoproclamada. O homem de massas é preguiçoso porque foi privado de sua individualidade, de sua vida interior, do afã de realizar esforços próprios para atingir objetivos e manter responsabilidade sobre suas escolhas. Presa fácil, ele prefere ouvir discursos que lhe colocam como vítima de um sistema e de um grupo de usurpadores que agem única e exclusivamente para deixá-lo distante dos direitos. Para mudar esse quadro, basta se revoltar contra o suposto vitimismo e deixar que ele se transforme em ódio. Uma vez no poder, aquela liderança que conquistou seu coração, que encantou seus ouvidos, que insuflou seus sentimentos mais emotivos e irascíveis e que lhe fez se sentir alguém no meio da massa, por ser a detentora única do entendimento acerca do devir da história, se encarregará de garantir um reino de prosperidade e harmonia eternas. Neste mundo.
O mantra dos tais direitos atinge não só aqueles que, por sua incapacidade intelectual, são mais facilmente enredados na teia do discurso ideológico, mas também (e até em maior quantidade) pessoas que aparentemente não vivenciam o universo das ideias politicas em seu cotidiano. Sob um ar blasé de não afetação, aprioristicamente distante do embate na ágora, de repente, essas mesmas pessoas estão repetindo de maneira totalmente inconsciente o discurso da liderança popular, o que contribui decisivamente para lhe outorgar pertinência, não evidentemente por trazer à tona entendimentos profundos ou por se aproximar de verdades, mas pelo fato de que uma mentira sedutora penetra por osmose no imaginário e se transmuta em suposta Verdade à velocidade da luz. É um processo silencioso e imperceptível para a maioria e resulta, para aqueles que conseguiram se manter imunes, em um afastamento forçado, defensivo, de autopreservação, mas perverso, pois acarreta em estigmatizações.
Quem acredita ser dono da chave da História só pode manter influência às custas da mentira, bem como participar de disputas pelo poder e/ou se manter nele lançando mão de estratégias totalitárias, no mínimo autoritárias. Será possível que o homem na sociedade de massas tome consciência de sua individualidade, que adquira propósitos dotados de algum caráter de nobreza, que seja capaz de exercer sua liberdade com o devido e indispensável grau de responsabilidade? Tem sido cada vez mais utópico acreditar que sim, mas se não restar uma centelha disso, então não haverá mais nada a fazer.

sábado, 21 de maio de 2016

Vladimir Safatle: mais um esquerdista cérebro de minhoca


O sr. Vladimir Safatle, como todo esquerdista, vira e mexe se vê na necessidade de elaborar explicações mirabolantes para tentar salvar suas ideias do fracasso. Logicamente, trata-se de tarefa impossível, dados os equívocos incontornáveis (para usar um termo caro ao "pensador" em questão) do esquerdismo e, se não fosse assim, não haveria justamente uma tal necessidade.
Em artigo publicado na última sexta-feira (20/05) na Folha de São Paulo, Safatle defende que não foi pela corrupção que milhões de brasileiros saíram às ruas exigindo uma alternativa para um país em queda livre (na visão dos lacaios petistas, esses milhões compõem uma oligarquia, análise cujo único efeito é provocar riso). Esses milhões, sufocados por um governo altamente incompetente, autoritário, sem projeto algum de administração, inebriado pelo poder, e que destruiu quase completamente a saúde, a educação, a cultura e uma série de empresas estatais, adoradas pelo próprio esquerdismo enquanto fornecedoras de pixulecos, manifestaram-se por uma série de insatisfações. É evidente que não foi apenas pela corrupção!
Não deveria ser preciso explicar pela enésima vez a mentes rasteiras como o sr. Safatle que, de fato, o PT não foi o inventor da corrupção e nem que seria a mais absoluta ingenuidade acreditar no fim da corrupção como consequência da destituição de Dilma Rousseff. O que o PT fez, foi arranjar justificativa e legitimação para a corrupção, pois é impossível manter uma máquina governamental centralizadora, autoritária, desenvolvimentista e assistencialista sem tornar os benefícios espúrios entre membros dessa mesma máquina uma regra, um método sistemático, um modus operandi. A corrupção no desgoverno petista, portanto, foi uma consequência inelutável da concepção ideológica de esquerda e da forma de organizar o aparelho estatal, inchado e montado a partir de critérios político-ideológicos. Não havia outro resultado possível a ser obtido no seio desse arcabouço, algo reconhecido por qualquer cientista político minimamente sério, mas que passa ao largo da cabecinha de minhoca do sr. Safatle.
O PT não apenas manteve, como acentuou fortemente uma miríade de práticas paternalistas que destroçaram valores públicos e os fizeram vetor de favores privados a erigir um projeto de poder autoritário, pesado, ineficiente e economicamente nefasto - práticas essas que, vale lembrar, sempre foram vituperadas pelos petistas enquanto estavam fora do poder, mas somente pelo fato de que eles mesmos precisavam criar um discurso aparentemente ético que lhes conferisse apoio e também porque, estando na oposição, lhes era difícil fazer parte do repasto. Antes que o primeiro mandato de Dilma se encerrasse, em 2012/2013, não foram poucos aqueles que procuraram alertar a presidente a respeito do que aconteceria se os rumos da administração não fossem mudados. Palavras ao vento, primeiro em função da natureza ideológica do PT, que não lhe permitiria nada diferente, segundo, porque o primeiro que ousasse criticar o governo era rapidamente achincalhado e estigmatizado em pronunciamentos oficiais do governo (já na era Lula, a catástrofe era prevista por alguns, mas naquela época, as conquistas proporcionadas pelo capitalismo e o bom momento econômico mundial, aliados a um quadro interno satisfatório devido ao ajuste econômico dos anos 1990, cegaram a opinião pública e a oposição, fraca por si só).
Assim sendo, a corrupção nunca foi mais do que uma consequência de um modo de administração pautado no sequestro da máquina pública com finalidades partidárias e relacionadas ao poder autoritário. A maior parte da população brasileira se levantou contra o todo dessa prática por questões ideológicas, já que diante de tamanhos descalabros, as ideias liberais conseguiram ganhar algum terreno à medida em que não apenas os escândalos iam sendo paulatinamente revelados, como, mais ainda, se tornara escancarado o fracasso das políticas petistas e o avanço devastador da recessão econômica. O sr. Safatle, petista e intelectualmente desonesto, não pode assumir essa situação, logo, só o que lhe resta é mostrar indignação por não mais estar ouvindo panelas (ele jamais se revoltou contra o aparelhamento, contra a desindustrialização, contra a gastança ineficiente e desenfreada sem contrapartida, contra o rombo das contas públicas, contra as falências no comércio, contra a inflação na casa dos dois dígitos, contra o desemprego em massa, contra os cortes bilionários na saúde e na educação, contra o dinheiro público roubado do contribuinte brasileiro para ser injetado em ditaduras de esquerda mundo afora, contra a destruição da Petrobrás, do BNDES, da Eletrobrás,.. contra nada daquilo que caracterizou a horripilância do desgoverno petista). Por pura desonestidade, pela vaidade típica de todo esquerdista, que se considera acima do bem e do mal, dos fatos mais concretos, pelo falso consolo que as tentativas tragicômicas de passar supostas lições intelectuais baseadas em ideias ridículas e ultrapassadas geram nos tolos, o sr. Safatle não pode ir além do palavreado gasto e vazio e é incapaz de observar que a população brasileira está bastante atenta às atitudes do novo governo e, na atual conjuntura, concede um voto de confiança (mas sempre pronto a desconfiar) a Michel Temer, para que no tempo que lhe resta até 2018, procure consertar os estragos sem precedentes provocados por treze anos de lixo petista.