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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O que Buda disse. E o que não disse


O sr. Olavo de Carvalho, filósofo a quem respeito por muito mais do que uma opinião, não sendo à toa o fato de seu site estar linkado neste blog, dá mostras de não compreender o budismo, o que é uma enorme pena! Em um artigo (“Meus caros críticos II” - www.olavodecarvalho.org/semana/120204msm.html) no qual responde a seu crítico Júlio Lemos, Olavo afirma não haver contradição em associar budismo e socialismo, isso porque há alguns anos o Dalai Lama se declarou marxista em termos políticos e sociais.
Ora, Olavo bem deve saber que não é porque uma pessoa - no caso o Dalai Lama, por mais que este seja o líder budista - dá uma declaração a respeito de suas concepções, que isso basta para que seja possível associar filosofias tão amplamente antagônicas quanto o budismo e o marxismo. A contradição em questão deve recair inteiramente sobre o Dalai Lama que, isso sim, cometeu um tremendo equívoco, tanto mais grave na medida em que os budistas tibetanos sofrem perseguição execrável do governo comunista chinês, assim como ocorre com os seguidores de Buda por parte do poder instituído em Mianmar.
A filosofia budista é totalmente fundada em princípios morais, no autodomínio, princípio que põe o indivíduo em primeiro plano, e na compaixão, elementos notoriamente contrários ao marxismo. Aqueles que tentam limpar a teoria de Marx das relações claras com a violência, com o ódio de classe e com os genocídios perpetrados pelas experiências nela inspiradas, assim como o Dalai Lama, estão a incorrer em contradição. Sobretudo no que tange às questões de fundo moral, é preciso ser dito, o budismo oferece reflexões muito mais precisas do que o cristianismo, do qual a mácula da Inquisição não pode ser apagada.
Como um filósofo que guarda lugar tão importante e justo para as discussões envolvendo a imaginação moral e conhecedor da obra de Irving Babbitt, o mais brilhante diálogo de um pensador ocidental com os ensinamentos de Buda, me parece bastante estranho que Olavo endosse qualquer aproximação entre budismo e socialismo. Prefiro acreditar que ele tenha feito tal afirmação somente no afã de responder a seu adversário e, como também é de seu conhecimento, inclusive mencionado no artigo em questão, existem contradições no pensamento dos teólogos da libertação, que produzem uma mescla esdrúxula entre cristianismo e marxismo. Quem já não foi pego de assalto ao ouvir a máxima: “Jesus Cristo era comunista”? Nessa caso, quem estaria se contradizendo, o cristianismo ou os teólogos da libertação?! Se deixarmos de apontar que o equívoco é destes, seríamos obrigados a não enxergar contradição na associação entre cristianismo e marxismo.
Para finalizar, cabe deixar claro que os milenares ensinamentos de Buda não devem jamais ser confundidos com as pseudofilosofias pós-modernas que estiveram em moda até pouco tempo, hoje já merecidamente padecendo do esquecimento, tais quais o transcendentalismo zen e o misticismo oriental, cujo principal guru é o sr. Fritjof Capra, defensor do irracionalismo, o que se mantém em completa oposição ao budismo, filosofia essencialmente racional. Como mostrou tão bem o historiador Robert Darnton, essa linha de pensamento é responsável por uma patética idealização do Oriente, aquela velha forma essencialista que cria um abismo tolo e intransponível entre ele e o Ocidente (poucos são os que se lembram que o cristianismo surgiu no Oriente). Curiosamente, no mesmo artigo que eu trouxe à baila, Olavo cita palavras do economista Cláudio de Moura Castro, segundo as quais os brasileiros (e acrescento: não apenas eles) não leem o que um autor escreve, mas sim o que imaginam que ele pensou. A asserção é absolutamente correta e vale tanto para o Dalai Lama e o budismo, como para qualquer outra filosofia.

10 comentários:

  1. Sou budista, o budismo não é pacifista, não é igualitário, tenho nojo a socialismo, e as demais doutrinas imundas de esquerda.

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  2. A esquerda sempre perseguiu as religiões e a liberdade de expressão religiosa, pois está baseada no materialismo histórico. Grandes massacres contra budistas foram levados a cabo por governos de esquerda. Milhares de templos budistas e relíquias históricas inestimáveis foram destroçados pelos governos de esquerda. Os governos de esquerda vêem o Budismo como apenas mais uma “superstição”, o “ópio do povo”. A doutrina marxista quase varreu o Budismo da China, estrangulou o Budismo na Mongólia, na Rússia, no Nepal e no Tibet. Muitos cidadãos de Taiwan ainda carregam na mente e no corpo as dolorosas lembranças da desgraça comunista de Mao.

    1- A fonte doutrinária da esquerda vê a história como um processo constante de “luta de classes”, o que bota abaixo a idéia de não-agressão budista (ahimsa).

    2-A esquerda prega o igualitarismo, o que invalida as distinções ensinadas nos sutras entre prthagjanas e aryas, entre monges e leigos, entre brâmanes, ksatriyas.

    3-A esquerda vê o homem como submetido ao estado, sendo que o Budismo vê o estado como submetido à grandeza do homem Iluminado.

    4- O Budismo é monarquista. Vários Budas são denominados de “raja”, ou seja, de “rei”, os soberanos dos Estados Budistas eram consagrados como “Chakravartins” (Giradores da Roda Do Dharma), reis como Asoka foram os grandes impulsionadores do Budismo enviando missionários para pregar o Dharma e o próprio Buda Sakyamuni é denominado de “Dharmaraja /Hô Oo/ Fa wang” (Rei do Dharma), isso sem contar o fato dele ser um príncipe dinástico, sucessor legítimo do trono…
    5-De acordo com o materialismo dialético a Iluminação de Buda é uma mentira, uma vez que foi um fenômeno condicionado pelas relações sociais, pelas forças produtivas e pelas condições materiais de Siddharta e do local onde estava. Ou seja, para eles a Natureza Original Iluminada não existe e nenhum esforço ascético ou moral conduz a lugar nenhum. Tudo se resume a forças de produção e dinheiro…

    Fonte: http://chakubuku-aryasattva.blogspot.com.br/2011/10/coniventes-com-o-erro-rigorosos-contra.html

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  3. É sempre a "mácula" da Inquisição, o cristianismo ficará para sempre marcado pela mácula da Inquisição como se um acontecimento de uma época que ocorreu por motivos políticos maculasse toda a doutrina cristã. O Budismo prega compaixão, mas o Cristianismo apesar de suas críticas realizou o ideal do budismo muito melhor do que as sociedades que alegavam serem budistas, basta ver o trabalho imenso de caridade e ajuda ao próximo feito por séculos por cristãos, que originou hospitais, orfanatos, asilos e toda uma cultura fundamentada na idéia de valorização da pessoa humana, muito diferente das culturas da Índia, China e Japão onde o indivíduo não valia nada se fosse de uma casta inferior. E não me venha falar de escravidão, porque se não fosse o Ocidente haveria até hoje escravos no Extremo Oriente e no mundo inteiro.

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  4. Cara, Manuela, este artigo deve ser entendido fundamentalmente como uma defesa do budismo (que inegavelmente, enquanto uma crença que não se fundamenta em nenhum corpo dogmático rígido, tampouco que alguma vez na história esteve intimamente ligada a governos instituídos - daí os exemplos dados por você, sobretudo em relação à Índia e à China, a primeira de maioria hindu e a segunda marcada por uma tradição de autocracia e posteriormente de comunismo, não serem válidos, é sem dúvida uma filosofia - mais do que uma religião - voltada à liberdade individual). No Ocidente, o individualismo aparece como ideal filosófico antes do Cristianismo, depois disso, se viu, em diversas situações, aplacado na Idade Media cristã e volta a surgir a partir do séc. XV, com o Renascimento, daí se desenvolvendo a partir de vários enfoques não derivados da religiosidade. Não nego de modo algum o louvor à filantropia e o respeito ao próximo recomendados ao fiel cristão, muito pelo contrário (minha única crítica ao Cristianismo embutida no texto tem a ver com a religião institucionalizada e a serviço de interesses outros que não a própria religião, como você mesma colocou).
    Ademais, a meu ver, o que inclusive expus no artigo, esse essencialismo Ocidente x Oriente é uma linha de análise extremamente ineficaz e superficial.
    Quanto ao tema escravidão, nem preciso comentar, já que não toquei no mesmo e nada tem a ver com o teor do artigo.
    Abraço.

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  5. O Olavo fala que o Islã domina todas as religiões, querendo dizer que existe inclusive um budismo que fomenta o Islão. O que você diz sobre isso, amigo?

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    1. Rafael, essa colocação foge completamente ao tema do artigo, mas vamos lá:
      Creio não ser bem isso, pois o que o Olavo afirma, na verdade, é que algumas culturas têm perdido sua dimensão simbólico-religiosa, o que em tese favoreceria a expansão do islamismo. Isso vale inclusive e sobretudo para o Ocidente cristão (mais ainda sob o papado de Bergoglio), que tem sido o alvo preferido do fanatismo Islâmico (é o que o Olavo trata, por exemplo, em As garras da Esfinge, referindo-se à filosofia perenialista). Essa mesma dimensão simbólico-religiosa, a seu modo, permanece forte no budismo.
      Ademais, o budismo é hoje uma religião minoritária no mundo, assim, tanto pelo seu poder de penetração, como principalmente em virtude de pregar uma mensagem fundamentalmente antípoda do Islan, acredito que pensar que o budismo ajuda a fomentar o islamismo não é uma análise lá muito profícua.

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    2. Só uns esclarecimentos,

      - Perdão por não se tratar de um assunto do post, mas é que eu ouvi isso, e tive que vir procurar com alguém que conhece tanto o Budismo quanto o pensamento do Olavo (este eu não conheço a fundo). Me pareceu que você podia me ajudar com isso.

      - O Olavo é contrário então, à filosofia perenialista?

      - Eu não penso que o budismo ajuda a fomentar o islamismo, eu acho completamente bizarro isso, mas eu ouvi o Olavo fazendo esta ilação com outras religiões E o budismo e quis perguntar para quem conhece.

      Agradeço.
      Acho que ficaria bom fazer um post com este tema, se você quiser. Prometo que venho ler.

      Abs

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  6. Olá, Rafael!
    Não há porque se desculpar. É que alguns leitores fazem questão de desviar o assunto do artigo com segundas intenções, então já levanto a bola logo de cara, mas observo claramente que não é o seu caso.
    Veja, o Olavo não é contrário ao perenialismo (se é que podemos pensá-lo em bloco, pois ocorreu um rompimento entre o fundador, René Guenon, e seu principal discípulo, Fritjof Schuon), antes ele o utiliza como instrumento de análise no que tange exatamente ao tema da perda da dimensão simbólico-religiosa no Ocidente cristão. Tal perda, me parece, é irrefutável.
    Eu tratei um pouco disso em vários artigos, colocando a coisa na perspectiva do que, remetendo-me a Irving Babbitt, chamo de "interioridade". Eric Voegelin, um dos filósofos que o Olavo mais tem como referência, também adota a ideia como recurso analítico.
    Certamente o Olavo não compartilharia das mesmas conclusões do Guenon, menos ainda do Schuon, mas ele utiliza o argumento central da perda da dimensão simbólico-religiosa como um esteio para pensar porque o Ocidente parece estar se rendendo ao Islan. A crítica dele ao budismo (que jamais pode ser confundido com o transcendentalismo zen, apenas um modismo ocidental que distorce tradições orientais) vai no mesmo sentido, contudo, uma vez podendo ser recuperada a dimensão simbólico-religiosa, tanto do Cristianismo como do próprio budismo, essas tradições atuariam como freios ao fanatismo islâmico.
    O assunto é dos mais espinhosos. Tenho tido muito pouco tempo para escrever artigos, mas quando sobrar algum, vou considerar sua sugestão.
    Por enquanto vamos trocando ideia.
    Valeu!

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  7. Eu acredito que em algum sentido, o budismo pode ter sido usado como uma tentativa de unir as pessoas sob um aspecto, mas sendo muito leve e contrário aos interesses globalistas, foi considerado uma fonte pobre. Talvez tenha sido tentado com o Budismo Tibetano (através destes Lamas), e com o Zen, que são bastante difundidos no Ocidente. Algo que também ocorreu com o Catolicismo. Os Poderes dominantes tentaram usar o Cristianismo para unir as pessoas sob uma narrativa única, e ela falhou. Daí vem esta nova tentativa com o Islamismo. Por enquanto, esta é a ideia que eu tenho sobre isso.

    Obrigado por responder, e por tirar esta dúvida.

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  8. É uma hipótese, Rafael.
    O mundo civilizado e que preza a liberdade terá que reconstruir uma narrativa capaz de fazer freio ao radicalismo islâmico.

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