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sábado, 26 de setembro de 2009

Para que servem os comentários sobre arbitragem?

A resposta já pode ser dada de cara, isto é, servem apenas para fomentar discussões inúteis e acirrar desnecessariamente as rivalidades clubísticas.
Na última quarta feira, dia 23/09, Cruzeiro e Palmeiras fizeram o jogo isolado que completou a 25a. rodada do Brasileiro 2009. A partida foi transferida para o meio da semana a pedido da Rede Globo, emissora que presta péssimos serviços ao país. Como destacou o excelente jornalista Mauro Cezar Pereira, da ESPN Brasil, o erro já começou aí, pois foi um duelo envolvendo o líder do campeonato, com todas as atenções voltadas para ele, exibido por dois canais da TV aberta, um jogo que atraiu a máxima atenção, sendo que um erro da arbitragem daria margem para discussões infindáveis, como de fato aconteceu.
O árbitro Evandro Rogério Roman, que já havia cometido alguns equívocos gritantes ao apitar outros jogos do certame, inclusive errando absurdamente contra o próprio Palmeiras quando este enfrentou o Goiás no primeiro turno, foi acusado de não ter apitado vários pênaltis pró Cruzeiro. Segundo José Roberto Wright, da Globo, Oscar Roberto Godói, da Band e Renato Maurício Prado, da Sportv, que nem é do ramo da arbitragem, teria havido de 2 pênaltis para mais a favor da equipe estrelada. O último dos três senhores chegou ao ridículo de afirmar que se o árbitro quisesse, poderia ter marcado tranquilamente 5 ou 6 pênaltis. Nada leva a crer que uma tal opinião possa ser imparcial, uma vez que nenhum observador neutro em estado mental de sanidade seria capaz de endossá-la. Sou palmeirense, portanto tampouco sou neutro, porém, despindo-me ao máximo da paixão, posso afirmar que houve dois lances discutíveis, Jumar em cima de Fabrício, Figueroa em cima de Diego Renan. No primeiro, pênalti, no segundo, uma disputa onde ambos os jogadores se enroscam, sem que o lateral alviverde tenha prevalecido na suposta ação faltosa. Chega-se à ponderação de que o árbitro poderia no máximo ter apitado duas penalidades para o Cruzeiro, o que é bem diferente de 5 ou 6, sr. Renato.
Wright e Godói, quando analisam os lances, se colocam como donos da verdade, coisa que não são, nem de longe. Duvido que eles próprios marcassem 5 ou 6 pênaltis num jogo, ao que me consta jamais marcaram. Mesmo vendo e revendo a imagem trocentas vezes, recurso que o árbitro não possui dentro do gramado, a análise é interpretativa em vários casos. Depois que o lance não tem mais volta, não adianta e nem há motivo para ficar batendo na tecla, já que isso pode, dependendo do alarde que a discussão ganhar, condicionar a arbitragem nas rodadas seguintes. Não duvido que seja esse o objetivo de parte da imprensa com relação ao Palmeiras.
E por falar em alarde, jamais vi a imprensa esportiva abordar tanto o tema quando o time envolvido não é o Palmeiras, mais um motivo para pensar que as opiniões nem sempre sejam isentas. Por que não falaram nada quando o sr. Roman operou o Palmeiras em Goiânia? Por que se calaram quando o próprio Cruzeiro foi prejudicado pelo mesmo árbitro em partida contra o São Paulo, também nesse campeonato? Por que fizeram vistas grossas quando o time de Itaquera venceu o Inter graças a dois gols em impedimento e, na rodada seguinte, empatou com o Botafogo devido a erros monumentais de arbitragem a seu favor? É sabido que tanto Globo quanto Band são anti-Palmeiras e altamente tendenciosas em favor do rival da zona Leste. Onde fica o respeito para com a imensa torcida palestrina? Roman pegou considerável suspensão após o jogo. Estranho, porque só agora, apenas quando o suposto favorecido é o Palmeiras e depois desse árbitro já ter errado tanto? No mais, a CBF está distante de ser uma entidade que mereça crédito.
Avante Palmeiras, mesmo com muitos secando e fazendo de tudo para que o título não venha, mesmo com um elenco formado por tantos cabeças de bagre, a chance de título existe e a liderança vem sendo firmemente mantida!

Em discussões depois da partida, cheguei a escutar que houve 8 pênaltis para o Cruzeiro. Sandices do tipo exacerbam a rivalidade, fazem aumentar a violência, em nada contribuem com o esporte. É preciso que a imprensa esportiva pontue suas análises com base na isenção, é uma questão de ética e responsabilidade. Poucos são os veículos que agem assim. A imprensa esportiva no Brasil é sensacionalista e prostituta.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Republicanismo e ideias autoritárias na América Espanhola


A figura pomposa e as ideias apenas aparentemente louváveis de Simon Bolívar são presença mais do que constante nos livros didáticos de História e até de Geografia do Ensino Básico no Brasil, são obrigatórias, uma profissão de fé para cientistas humanos que permanecem ainda hoje centrando suas análises em paixões ideológicas, em conceitos ultrapassados e carentes de rigor científico. Nesses manuais, Bolívar aparece da maneira mais descarada possível como "o libertador", tornando a atuação histórica de homens como Sucre, O´Higgins e sobretudo San Martín, relegada ao plano do absoluto esquecimento. Não para por aí, sendo que o ideário do venezuelano é apresentado de modo a fazer o estudante entendê-lo como perfeitamente plausível, apenas não tendo logrado sucesso devido às forças de uma elite, a qual os autores nem se esforçam para qualificar por quem foi composta ou quais eram seus interesses, que inclusive - e obviamente essa é uma informação omitida - muitas vezes se assemelhavam muito aos do próprio Bolívar.
Fazer da América Espanhola uma só nação pós independente, a Gran Colômbia, nome em homenagem, vejam só os paradoxos da história, a Cristóvão Colombo, o europeu que primeiro pisou na América, ao menos considerando aquilo que é documentado. Esse foi o maior intento de Bolívar, ele que como todo criollo dos séculos XVIII e XIX, estudou na Europa e manteve contato com o pensamento iluminista. Quem enxerga a América Espanhola em toda sua diversidade, quem sabe esmiuçar a mentalidade política de Bolívar e quem principalmente conhece as possibilidades de florescimento de um sistema livre e republicano, logo vê que a ideia bolivariana jamais passou de megalomaníaca e autoritária.
O libertador da esquerda tradicional, na realidade, sempre se autoprojetou como um Napoleão dos trópicos, justo o corso, que na política, representou a negação dos ideais iluministas, inicialmente norteadores da Revolução Francesa. Os trajes militares e o cavalo branco, emulados do déspota europeu, não deixam enganar. Bolívar sempre manteve o claro objetivo de governar autoritariamente a Gran Colômbia e exercer seu despotismo sobre uma massa de gente inculta. O caudilhismo dos chefes locais suplantou o bolivarianismo, mas essa fragmentação do poder, apenas fez surgir filhotes do tirano-pai, não mudou tanta coisa, talvez tivesse sido ainda pior se ele conseguisse seu intento.
O argentino San Martín lutou tanto quanto Bolívar pela independência da América Espanhola, mas seu nome não tem merecido nem sequer mínimas menções em nossos manuais escolares. Ora, por que? A resposta é simples: as ideias de San Martín são contrárias ao marxismo das velhas esquerdas. San Martín fora um liberal-republicano e, ao comandar exércitos de libertação na América Espanhola, desejava que as terras livres pudessem fazer brotar verdadeiras repúblicas nas ex-colônias. Cedo ele notou que a sanha de poder de homens com o mesmo pensamento de Bolívar constituía obstáculo fortíssimo ao republicanismo democrático, além do que a própria ignorância política deixada por mais de três séculos de exploração, tornava pobre o solo da ideia liberal.
San Martín também estudou na Europa setecentista, captou com senso agudo os ensinamentos de Voltaire, Montesquieu, Condorcet, Kant e adquiriu o conhecimento de que sistemas livres nascem do seio da própria sociedade, dependem de uma cultura democrática, que se gesta lentamente nas mentes da população, requerem atuação política, separação entre público e privado, noção sofisticada de ética, gosto pela história, pela filosofia, pelas artes, tudo que infelizmente não se via na recém independente América Espanhola, contexto que serviu de prato cheio para líderes autoritários, entre os quais Bolívar foi só mais um. Diante de tal quadro social, San Martín lavou as mãos e, tendo cumprido o papel na luta pela independência, se retirou de cena e voltou à Europa. A glória pessoal e o poder definitivamente não lhe atraíam, afinal, era um liberal.
Hoje em dia, o maior herdeiro político de Bolívar só poderia mesmo ter surgido num país miserável como a Venezuela. Trata-se de Hugo Chávez, ditador e fanfarrão, cujas ideias vão na contramão do mundo moderno e da integração socioeconômica que a globalização requer. Oxalá o povo venezuelano continue bravo em sua luta pela liberdade do país. Está difícil, Chávez já até espalhou suas crias pelo continente, vide o cocaleiro-déspota Evo Morales, que em nada representa as etnias indígenas bolivianas.
A continuarem os estudantes latino-americanos sendo ensinados que Bolívar foi exemplo de ideário político, o continente permanecerá sofrendo da miséria. Já é mais do que hora de resgatar San Martín de seu exílio.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Alexis de Tocqueville: as múltiplas dimensões da história e a questão da igualdade


O ano de 2009 faz completar o sesquicentenário da morte de Alexis de Tocqueville, historiador, sociólogo, filósofo, jurista e moralista francês do século XIX, herdeiro da mais genuína tradição iluminista.
No Brasil, pelo menos até o momento, o fato não foi nem sequer minimamente comentado. Trivial, pois se até nos maiores centros de estudos de Humanidades, como a França, terra-mãe do próprio Tocqueville, ou a Inglaterra, o marxismo ainda predomina largarmente, o que dizer de um país no qual os estudos do tema somente ressoam o que ocorre no Velho Mundo? Justiça seja feita, a exceção fica por conta da editora Martins Fontes, que lançou edição atualizada de O Antigo Regime e a Revolução, um dos clássicos do autor.
Tocqueville, sua obra e todos aqueles que não têm receio em seguir suas ideias, são mal vistos em boa parte dos círculos acadêmicos das Humanidades, tudo, evidentemente, devido a preconceitos ideológicos. Sua origem nobre, apesar do berço nunca ter moldado seu intelecto, bem como o caráter liberal de sua obra, o tornam oposto ao marxismo e à concepção de história das esquerdas revolucionárias. Curiosamente, a grande maioria de seus detratores nunca leu nada de seus escritos, tendo ouvido falar dele apenas superficialmente, como um conservador. Teria acontecido comigo na própria graduação, não fossem a isenção e o conhecimento de professores como os grandes Ottaviano de Fiore e Alexandre Hecker. A ignorância em relação ao pensamento de Tocqueville é ainda normal, se considerado o fato de que os "revolucionários" nem mesmo leram a fundo aquilo que veio da pena do próprio Marx, quanto mais a daquele que é seu antípoda.
A comparação entre Tocqueville e Marx é sempre profícua, já que a despeito da enorme vantagem do segundo em relação à divulgação da obra, o poder de explicação imensamente superior do primeiro fica patente quando o assunto é o valor das reflexões de ambos. Enquanto Marx, possuído por sua visão progresso-cientificista e sustentado pelas verbas do burguês velado Engels, deu à história o peso de uma marcha pré-programada e unívoca, necessitando para tanto elaborar um esquema cheio de etapas simplistas e desprovidas das outras dimensões históricas que não a econômica, Tocqueville erigiu a linha mestra de suas ideias sempre estando presente no palco das ações humanas. Por um lado, como político na velha França, por outro, como pesquisador de campo - algo evidentemente raro na historiografia - na novíssima América da democracia moderna. Ao invés das tautologias classistas de Marx, que lhe fizeram pensar nos sujeitos históricos a partir de características unidimensionais, sem atentar para a noção de que a política, a cultura, a filosofia, a mentalidade, podem elas mesmas direcionar as relações de classe, Tocqueville, de forma bem mais clara e perspicaz, viu nos processos históricos da era Contemporânea o emergir de um elemento novo e comum: a igualdade.
A igualdade para Tocqueville é resultado de um processo histórico fruto da imbricação entre as várias dimensões históricas e os sujeitos históricos que perfazem a coletividade, também eles imbuídos e partícipes dessas dimensões. Não é um elemento inexorável, produto único e exclusivo de uma história que não é reconhecida pelo elemento humano, empreendida tão somente pelas forças meta-históricas da Economia, como para Marx, no que então ela não seria mais do que uma consequência da base material. Na obra de Tocqueville, a igualdade é gestada na história, passível de avanços e retrocessos, é uma tendência da modernidade, ratificada ou não de acordo com as variações na forma dos sujeitos sociais entenderem e atuarem sobre as dimensões históricas. Em Tocqueville, a igualdade não é uma situação forçada e a-histórica de condições a fortiori, uma igualdade de resultados, como nas reflexões marxianas, mas sim um desejável sinal de avanço social e histórico fruto da gestão inteligente dos problemas humanos em sociedade, por assim dizer, uma igualdade de oportunidades.
É de suma importância ressaltar que, segundo Tocqueville, a igualdade só é fecunda se acompanhada de liberdade, uma inteligente sutileza teórica do francês, observada por ele na prática, que nos leva a perceber que em sociedades adaptadas à modernidade, os interesses individuais se coadunam com os públicos. Já no caso de Marx, a liberdade só chega (na realidade não chega, mas sim a opressão da ditadura do partido único) após o banho de sangue da revolução, desfecho da necessidade pré-estabelecida da derrubada da "sociedade burguesa" e instauração do comunismo, típica aberração de uma teoria que perde de vista qualquer elemento de ética iluminista. Como já frisei em outra ocasião, Marx leu Hobbes, mas não aprendeu muita coisa. Marx não percebeu, assim como os marxistas não percebem, que o comunismo sempre descamba no próprio Leviatã hobbesiano, com a diferença importante de que na obra do inglês, o controle social tem uma base contratual, não revolucionária. O que garantiria a harmonia do estado sem classes se o primeiro impulso humano é a autopreservação? Marx é muito mais um romântico, fanático pelo lumpem e pelo anti-semitismo, do que um discípulo do Iluminismo.
Tanto Tocqueville como Marx foram homens do século XIX e, enquanto o primeiro observou a tendência da igualdade na contemporaneidade, o segundo previu o fim do capitalismo. Passado um século e meio desde então, não só o capitalismo mostra capacidade de renovação e, claramente, potencial para reduzir desigualdades, fato que qualquer um que não seja dominado por paixões ideológicas consegue notar, como também a teoria marxiana, invariavelmente quando tentada na prática, pariu os lênins, os stálins, os maos, os pol pots e os fidéis da história. Cada um que escolha quem foi o mais perspicaz...

terça-feira, 1 de setembro de 2009

A degeneração de um bairro tradicional

Estou com 32 anos de idade, contabilizo 25 como morador do bairro da Lapa, região Oeste da capital paulista. Mesmo nos períodos em que não residi no coração lapeano, frequentei o mesmo semanalmente.
Tenho história na Lapa, história que ela própria tanto possui, pois é um dos bairros mais antigos da pauliceia, produto da imigração italiana na segunda metade do século XIX, crescido e desenvolvido em um dos primeiros surtos de industrialização do Brasil, no início do século XX, momento no qual os lucros do café decaíram e passaram a ser investidos no setor secundário. Obviamente, as mudanças ocorridas desde então foram totais e a Lapa ganhou outra paisagem, outra condição, tornando-se um bairro que, a exemplo de vários outros da megalópole, adentraram junto com ela na modernidade, ainda que em países como o Brasil, esse processo tenha se dado da forma mais atropelada possível, sem o acompanhamento da melhoria na infraestrutura.
O que posso afirmar, conhecendo muito bem a Lapa, é que ela jamais esteve em uma situação de tão gritante abandono e degradação como se encontra no momento presente. Ao mesmo tempo em que observa-se a instalação de grandes empreendimentos imobiliários, - com tudo que trazem de negativo, ainda podem ser a solução - o bairro virou local de proliferação de prostíbulos da mais baixa categoria, antros de dar nojo, dos quais o cheiro de naftalina exala e se mistura ao ar já poluído da rua. Há alguns anos eles estão em funcionamento, denúncias feitas, fecham por algum período, mas voltam a abrir portas novamente. Onde estão as autoridades?
Não acaba por aí..., a quantidade de lixo depositado inadequadamente nas ruas lapeanas é de assustar. Há de todos os tipos, desde simples sacos colocados na rua fora do horário de coleta, passando por sujeira comum, - copinhos, papéis de bala, panfletos e afins, descartada por transeuntes inconsequentes e sujismundos que não são moradores do bairro, até entulho, sofá, restos de comida que provocam náusea ou mesmo o que sobrou de um velho portão, também ele permeado por histórias lapeanas de antanha. Uma imensa variedade de lixo, espalhada por todo o bairro, em cada via, em cada maltratado canteiro ao pé das árvores, o puro retrato do descaso e da total falta de respeito para com o cidadão-morador-contribuinte. Onde estão as autoridades?
Soninha Francine é a atual subprefeita do bairro, cargo que ocupa desde o início desse ano. De lá para cá, só houve piora na situação e me pergunto qual a relação de Soninha com a Lapa. Será que tem alguma? Recentemente, ela declarou que o salário de R$ 6 mil (!) que fatura para administrar a Lapa é uma brincadeira. A subprefeita poderia renunciar ao cargo e ficar apenas com as cifras polpudas que deve obter como comentarista esportiva na ESPN Brasil, algo que inclusive ela faz quase tão mal quanto administra o bairro. Ninguém de bom senso faz questão de sua gestão. Soninha pretende se candidatar ao governo do Estado... Soninha, o que você me diz sobre a situação da Lapa?
O panorama é triste e revoltante, a esperança é que alguém de mais capacidade administrativa possa, a algum momento, tomar as rédeas, se bem que a cada dia o ceticismo em relação a políticos competentes aumenta mais e mais. Tal esperança se assemelha a uma quimera. Talvez, os tantos empreendimentos imobiliários anteriormente citados, possam pressionar pelas urgentes providências, afinal, irá o comprador de tão alto poder aquisitivo conformar-se em residir num bairro francamente degenerado? Tudo é uma questão de cidadania...

domingo, 16 de agosto de 2009

Fragmentos da miséria intelectual brasileira

Os trechos abaixo foram extraídos de um fórum de discussão na Internet (Viciados em livros - isso tem um forte significado!), o qual, em um de seus tópicos, aborda os livros da escritora de temática teen, Sthephenie Meyer. A discussão teve início a partir de uma postagem que colocava em questão a qualidade da literatura de Meyer, tendo espraiado para temas paralelos ao longo do debate. O ideal é acompanhar a discussão por inteiro no próprio fórum (não vou postar o link aqui, mas basta acessar o Orkut e procurar pela comunidade Viciados em Livros e entrar no tópico "Stephenie Meyer, uma referencial?") para que o leitor possa tirar suas próprias conclusões. O que trago a seguir, é uma seleção de sentenças que, observe-se bem, pelo rumo tomado na discussão, revelam o perfil intelectual do brasileiro médio (preservei o texto original dos postantes). Ria, ou chore...

Ainda não podemos, em nossa própria voz, contrariar o público de Meyer, que ao meu ver são tantos, pelo fato de estarmos em um país desvalorizado quanto à literatura, e principalmente ao meio jovem; porém creio piamente que surgirão escritores com potencial de trazer aos jovens e adolescentes uma qualidade em romances de modo que se interessem mais tarde por escritores como William Shakespeare e Jane Austen. Ah, se lêssemos mais romances! - Esse é o criador do tópico, tentando transmitir uma ideia audaciosa através de uma escrita bem confusa. Note-se que ele tenta se imbuir de uma postura intelectual.

Eu mereço! - O primeiro post do tópico! (risos)

meu!!!
exite livros pra todos os gostos.. todos os estilos e pra todos momentos da vida de uma pessoa...
cada um é cada um...a maioria q leu Stephenie Meyer adorou.. e leu a serie toda!
por que nao???
muitos leem Stephenie e le classicos tbm. qual o preconceito???
o importante é ler algo.. ocupar a mente.. ativar a memoria .. a imaginação...
muito melhor do que ficar em frente da tv.. ou vendo bobeiras na net....
seja Stephenie ou Shakespeare!!!
cada um q cuide da sua vida!
cada um q escolha seus livros!!!

Adoro ler mas não gosto de ler clássicos, nem por isso me considero menos inteligente por isso.
Não li nenhum livro dela ainda, só comentários, mas acho que a gente deve ler aquilo que nos faz bem e se isso for Crepúsculo, que seja Viva la Vida.

Brasil nos faz ter esses pensamentos, bem compreensível. - Este é o criador do tópico. Ele foi bem...

Certamente a autora citada NÃO é um referencial, pois sua literatura passa longe, muito longe da qualidade dos clássicos. Não precisa nem de um clássico, se pensarmos em valores mais novos, como Philip Roth ou Milton Hatoum, Meyer parece uma anedota infantil. Tudo isso se levarmos em conta VALOR LITERÁRIO.
Por outro lado, por questões citadas ao longo do tópico, parece interessante que adolescentes se sintam atraídos pela leitura de Meyer. Como frisou um membro, fica difícil, de acordo com o atual estilo de vida e gostos do público dessa faixa etária, exigir que leiam literatura mais elaborada, sendo que nem o vocabulário deles pode ser qualificado de razoável. Vivo isso a cada dia, pois sou professor. Se os livros de Meyer despertarem algum gosto pela literatura, o que não deixa de ser possível, quem sabe os livros dela não estarão prestando um bom serviço? No mínimo, melhora-se o vocabulário, a escrita e a comunicação verbal. - Minha contribuição.

Acho que Mesk (criador do tópico) precisa aprender a escrever textos mais compreensíveis, sua crítica aos livros da Meier é uma bela amostra de pedantismo redacional e pseudointelectualidade literária. Ah, se tivessemos o hábito de escrever... nossos textos seriam mais claros! - Um membro que tentou dar toque mais sofisticado à discussão, embora eu não tenha concordado com ele em tudo.

E Paulo Coelho é outro que soube transformar suas experiências em livros populares, escrevendo de forma simples e atingindo as necessidades das pessoas de seu tempo. Com isso atraiu a ira dos pseudointelectuais. - O mesmo membro do post anterior. Ele foi mal...

Eu leio qualquer tipo de livro. Mesmo. Gostei da série Crepúsculo assim como gosto de vários outros livros que falam de coisas completamente diferentes. A Meyer soube escrever e acertar em cheio o tipo de leitura dos jovens de hoje em dia. Não que os jovens estejam certos em ler livros com histórias tão "banais", mas deixa a mulher escrever o que ela gosta e ganhar o dinheiro dela, ela não tá fazendo mal a ninguém. Simples assim. - Simples...

É popular porque alcança o povo, entendido como uma grande massa, mesmo que segmentada por faixa etária. Livros herméticos não alcançam o povo, só uma pequena classe de arrogantes pseudointelectuais. Esses pedantes só produzem obras-primas entre aspas, faltou colocá-las no post de ontem. Na verdade, são excrementos de literatura.

Só uma coisa óbvia, mas que nem sempre é entendida como tal, isto é, não é porque uma obra se torna best seller que isso faz dela algo de boa qualidade, pelo contrário, sobretudo no Brasil e na atual sociedade do espetáculo e da cultura de massa. - Minha contribuição, em resposta ao post anterior.

Meyer é ótima escritora porque conhece o gosto de seu público e sabe escrever como ele quer. Está plenamente sintonizada com seus leitores. É evidente que uma obra de Descartes não é desqualificada porque poucos conseguem ler. Também é fato que filósofos acham que só conseguem prestígio se escreverem de forma difícil, mas A Crítica da Razão Pura de Kant é obra fundamental da humanidade. O problema é esconder incompetência debaixo de linguagem pedante e falsa intelectualidade, coisa muito comum.

A acessibilidade, por si só, não garante qualidade, do contrário, o que pensar de um Pe. Antonio Vieira ou de um Alphonsus de Guimaraens?
Do mesmo modo, o rebuscamento, quando anódino, é uma lástima, vide pós-modernistas como Hayden White, Giles Deleuze, para não falar do superestimado Foucalt. - Eu, de novo.

Vorou papo de "intelectual" ... - Um dos membros, após verificar o rumo que a discussão vinha tomando...

Locke?
Descartes?
Maquiavel?
Kant?
Pe. Antonio Vieira? (de qual igreja?)
Alphonsus de Guimaraens? (que nome feio)
Quem são esses?
Acho melhor vocês lerem crepúsculo!
Melhor livro que eu já li em minha vida. - O mesmo membro do post anterior.

quem fica criticando qualquer escritor que seja, deveria escrever melhor e fazer mais sucesso que o alvo da ira.
Esse mundo é cheio de pseudos... pseudos sabedores de literatura, de cinema , de teatro. É gente que acha que só o que é clássico é bom... ou só o que ele gosta é bom. Tudo que cai no gosto popular é ruim...
Já faz tempos que certas coisas já deixaram de ser feitas só para os pseudos, elite etc e tals... hoje quem não escreve pra todo mundo ler, ou não faz filme-industria... I'm sorry... mas não vai conseguir ir muito longe não.
Graças a Deus, hoje em dia estão fazendo cultura e informação para todo mundo, para todos os gostos.
Se eu tivesse que me contentar em ler somente Locke, Kant, Maquiavel...leitura seria algo que não faria parte da minha vida e com certeza de GRANDE parte das pessoas!!!
Desde que desperte algum tipo de emoção: curiosidade, amor, ódio, tristeza, alegria seja Stephenie Meyer, Shakespeare, Carlos Drummond ou Paulo Coelho tudo tá valendo...depende do gosto de cada um. E feliz do que gosta de todos e não tem preconceito!!! - Eu não poderia ter escolhido outro excerto para encerrar o artigo! Lindo, não é mesmo?! É a cara do Brasil!

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O peso dos dogmas e a libertação filosófica

A religião sempre foi e sempre será um assunto polêmico. Aqueles que se colocam como ateus, sofrem ainda hoje de forte preconceito, sem que a maioria dos crentes saiba que certas religiões não advogam a fé numa entidade criadora, primordial, onipotente e onisciente, com toda a contradição que esses dois últimos atributos implicam. Assim é o budismo, uma religião que está muito mais para a filosofia do que propriamente para uma questão de fé, daí minha inclinação e interesse pelos ensinamentos de Siddharta.
Religiões de revelação, tais como o cristianismo e o islamismo, me soam aterrorizantes, são autênticas prisões espirituais, uma vez que a carga de pecaminosidade que incide sobre o homem segundo seu corpo dogmático, não confere nenhuma possibilidade de construção espiritual ao crente. Resta a fé revelada e dogmática e aquele que não segui-la corretamente, está condenado à ira divina.
Essas religiões não servem às mentes inquisitivas, que buscam uma relação de interação com os mistérios, de forma que isso possa legar engrandecimento filosófico e espiritual. Deus, nas religiões reveladas, acaba se manifestando como um escape aos mistérios, uma entidade capaz de conceder o bem, caso o crente tenha uma postura de retidão religiosa. Já em caso da não obtenção da graça, fica o falso consolo de que "Ele sabe o que faz", "Ele quis assim", uma lógica perversa, pois Deus, por ser considerado acima de tudo, não permite a relação com nenhum mistério e, consequentemente, aquele engrandecimento filosófico espiritual inexiste. Assim, Deus é o próprio mistério. A mim não satisfaz, fica faltando algo.
Diferentemente da maior parte das tradicionais religiões de matriz judaico-cristã, o budismo traz consigo uma grande noção de responsabilidade individual, já que a pessoa deve procurar, a partir do diálogo com sua própria mente, a cessação, ou Nirvana, estado pelo qual se alcança a percepção da conexão de todas a formas de vida e, com isso, da impermanência e ao mesmo tempo da infinitude do Universo. É exatamente nesse sentido que a filosofia budista abre de modo inequívoco a possibilidade de engrandecimento espiritual. Ao contrário das religiões reveladas, o budismo ensina a busca da sabedoria, não fazendo pesar sobre ninguém pecados retroativos derivados de corpos dogmáticos que funcionam como tenebrosos sinais de alerta, sempre prontos a soar pelos "guardiões da fé".
O budismo não possui dogmas, apenas alguns princípios simples que auxiliam a fascinante jornada em direção ao Nirvana, dentre eles, o vegetarianismo, uma prática que, por preservar vidas, faz observar a conexão entre as criaturas sencientes e o consequente respeito pelas mesmas. É ainda por meio dessas práticas filosóficas que o budismo oferece uma relação muito mais saudável com os mistérios, porque nos ensina a não recuar diante deles, a não enquadrá-los em dogmas pré-fabricados, mas sim a encará-los com viés filosófico e espírito racional.
Experimentar o Nirvana é alcançar a mais perfeita e maravilhosa percepção de que somos todos uma única e grande entidade cósmica, é obter a compreensão de nossa finita existência individual, mas também de nossa infinitude enquanto partícipes de um processo de recriação que mantém o Universo. No momento mesmo em que se adquire a noção de que todo o Universo está interconectado numa flor ou num animal, seja ele um pequeno inseto ou um grandioso mamífero, o respeito à vida surge como consequência simples, clara e natural, respeito esse que nos responsabiliza pelo meio em que vivemos e que é parte íntima de nossa existência.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Princípios versus transformação

Vivemos em um mundo que se transforma cada vez mais rapidamente, ninguém duvida disso, ninguém deixa de sentir tal fato na própria pele. As tecnologias, que avançam à velocidade da luz, fazem com que o modo de vida das pessoas se altere em função delas, a globalização reduz tempo e distância a pó. Hoje em dia é possível realizar uma série de atividades que anteriormente demandavam horas, dias ou até mesmo meses, apenas apertando botões, sentado na poltrona, dentro de casa. Uma pergunta importante, levando isso em conta, é: até que ponto os princípios ficam abalados em um mundo tão diferente, no qual mesmo o presente se torna passado em questão de pouco tempo?
No vocabulário político, os termos "princípio" e "transformação" são normalmente tratados de
conservadorismo e revolução, respectivamente, ganhando assim conotação mais complexa, o que no caso não é algo positivo, uma vez que faz o problema se tornar mais espinhoso do que já é. Um esquerdista radical qualifica qualquer princípio de conservador sem se dar conta da imensa contradição que isso implica. Depois de consolidada a revolução, o que passa a ser um revolucionário? Um guardião da mudança, que zela pela própria transformação? Não, simplesmente um conservador da ordem que ele próprio estabeleceu!
É possível ainda bater na tecla da própria globalização, indagando a postura do radical de esquerda em relação ao mundo em que vivemos atualmente. Com tudo de novo que a globalização traz, sejam benefícios ou prejuízos, o globofóbico a condena totalmente, pois ela é uma expressão do capitalismo. Justo aquele que se diz revolucionário, se posta como um ferrenho opositor das mudanças! Obviamente, se coloca a questão do tipo de mudança que se está a defender, no entanto, poucas vezes isso ocorre no debate político. É corriqueiro observar um globofóbico vestir o traje mais conservador possível quando muitas vezes é pêgo vociferando contra tecnologias que ele mesmo faz uso constante e que nem mesmo o ogro mais tacanha seria capaz de negar a melhora de condição de vida que tal tecnologia traz. Afinal, um esquerdista é um revolucionário ou um conservador? Ficamos sem saber...
A bem da verdade, as mesmíssimas contradições são notadas em quem se intitula direitista. Muitos que se colocam nesse lado do espectro político defendem com unhas e dentes os dogmas do catolicismo, por mais incongruentes que sejam e são contrários a inúmeros avanços da ciência, ao mesmo tempo que são capazes de defender a devastação ambiental em nome do "progresso". Também não sabemos claramente se o direitista é conservador ou "progressista", como costuma dizer para escapar do epíteto de "revolucionário".
Como se pode notar, introduzir o matiz da política em questões que são em sua essência filosóficas, no mais das vezes não ajuda a obter uma resposta, só obscurecendo a capacidade de reflexão. Não tenho a pretensão de responder de maneira inteiramente objetiva ao problema que formulei de início. Isso fugiria mesmo ao âmbito das Humanidades, além do próprio fato de ser uma interrogação difícil para ser respondida de imediato.
De todo modo, penso que não existe, na realidade, uma oposição entre princípios e transformação, o que poria em xeque o título do artigo. No fundo, manter certos princípios, é condição
sine qua non se torna impossível compreender e lidar com as mudanças que vivenciamos a cada dia. Para qualquer radical, de um ou outro extremo do espectro político, a resposta à pergunta seria um SIM peremptório, pois pessoas assim pensam com base em sistemas unívocos que conferem pouco ou nenhum espaço de manobra ao indivíduo, isto é, num mundo transformado, no qual os tais sistemas entram em colapso, os princípios se arruinam junto com esse turbilhão. A lógica dos sistemas unívocos é sempre perversa, acaba com a previsibilidade das leis, opera a partir da intimidação e da vigilância e assim, torna impraticável a manutenção dos princípios, já que estes seriam uma arma contra a opressão. Como refletiu Hannah Arendt, totalitarismos buscam a supressão do que há de mais humano no Homem, isto é, a capacidade de reflexão e discernimento.
Os verdadeiros princípios porém, podem sobreviver aos sistemas unívocos, dando a quem os possui, capacidade de lidar com transformações que são positivas, ou manter postura crítica em relação ao que é negativo. Desse modo, por exemplo, vê-se com a maior aprovação os avanços da medicina ou da produção de novos materiais e novas formas de obtenção de energia, que são muito menos impactantes ao ambiente. Por outro lado, reprova-se com veemência a devastação da natureza ou a falta de tolerância e solidariedade, tão fáceis de se observar nos dias de hoje. Princípios sólidos, que independem de sistemas, ajudam ainda a distinguir posturas ideológicas críveis ou não. Sendo assim, condena-se inteiramente qualquer forma de racismo, conceito já desmentido pela ciência e que se traduz por um infundado desejo de manutenção de pureza biológica, como se o fenótipo determinasse traços de caráter. Reprova-se também o culto à ignorância comum em nossa atualidade, onde o conhecimento e a erudição são descartados até mesmo por quem deveria valorizá-los ao máximo, como professores universitários ou homens de estado.
Um materialista de plantão poderia estar pronto para desferir sua flechada venenosa contra o conceito de "princípio" o qual ele certamente qualifica invariavelmente de "abstração". Cabe colocar que esse conceito tem a ver com aquele "dever interior" o qual mencionei no artigo anterior. É uma questão ética, para a qual sempre vale a diferenciação fundamental entre o certo e o errado. O que sempre irá existir são coisas positivas e negativas. Sistemas unívocos saídos de pesados tratados como
O capital ou Minha Luta, é que se revelam abstrações perversas quando tentados na prática.