Quando a educação era minimamente levada a sério no Brasil, e isso já faz um bom tempo, ela não se encontrava em estágio universalizado. Quem estudava, de fato mantinha contato íntimo e produtivo com a educação enquanto formadora do caráter, mas poucos tinham essa possibilidade. Décadas se passaram e o acesso à educação no país se tornou quase que totalmente abrangente, no entanto, em escala inversamente proporcional, a qualidade do ensino decaiu brutalmente.
No espaço de tempo que compreendeu a universalização da educação básica e a queda de sua qualidade, observou-se também o surgimento de novas correntes pedagógicas cujo matiz esquerdista e relativista contribuiu decisivamente para o sucateamento do ensino brasileiro. Muitos dos adeptos e reprodutores das ideias construtivistas e paulofreireanas se estabeleceram como professores, orientadores educacionais, coordenadores, pedagogos e psicopedagogos, os próprios norteadores da educação no Brasil.
Diante de tal quadro, não é de se estranhar a quantidade de direitos e regalias com os quais cada vez mais passaram a contar os alunos e, por tabela, os pais destes, complacentes com a irresponsabilidade, o desleixo, o deboche, a falta de postura e interesse por parte de seus filhos. Para coroar a falência de um sistema educacional pautado no famoso "jeitinho" brasileiro, a prática dos tais laudos emitidos por "especialistas" de porta de escola coadunados com toda essa situação se tornou absolutamente comum: não falta muito para que cheguemos em uma época na qual o aluno que não tiver laudo será a exceção. Disgrafia, discalculia, dislexia, déficit de atenção, hiperatividade e outras deficiências descobertas e superdimensionadas pela nova "ciência" psicopedagógica relativista constituem o leitmotiv da complacência e da permissividade, pilares sem os quais parece não mais poder haver educação no Brasil.
Longe de mim estar aqui querendo contestar o trabalho de especialistas sérios e comprometidos que contribuíram ao longo dos últimos tempos com o desvendar de situações produzidas pelo cérebro humano que podem afetar o desempenho de alunos ou de qualquer pessoa. A atividade científica idônea é sempre louvável naquilo que descobre e traz como propedêutica. Nesse âmbito, uma vez diagnosticado com algum problema gerador de prejuízos em seu processo de aprendizagem, o aluno se torna merecedor de atenção redobrada por parte de pais e educadores, o que guarda uma distância abissal com relação às práticas que motivam esta crítica. Um laudo psicopedagógico serve para que os educadores elaborem formas diferentes de avaliação e analisem os resultados do portador de forma a considerar as limitações que o problema específico seja capaz de impor. O laudo jamais isenta o aluno portador do cumprimento das exigências e esforços inerentes ao processo de ensino-aprendizagem. O laudo jamais deveria funcionar como indutor do descompromisso, como uma escora de complacência e permissividade, como elemento dispensador de obrigações. Todavia, é exatamente dessa maneira que tem servido esse instrumento: ao invés de ser tratado como um documento que permita interpretar resultados a partir da consideração da deficiência diagnosticada, revela-se uma muleta da desobrigação.
Além de formar mal no que se refere ao quesito estritamente técnico, a educação brasileira, dominada por políticas pedagógicas esquerdistas/relativistas, não cumpre seu principal papel, ou seja, não ajuda a construir um caráter e uma personalidade assentados sobre os princípios éticos e morais da responsabilidade e do sacrifício do ego em prol das virtudes. E antes que algum ideólogo se manifeste, essa deplorável situação anda de mãos dadas com aquela sanha de lucros fáceis e maracutaias que caracteriza certo tipo de capitalismo tupiniquim, não o verdadeiro capitalismo, que não se realiza sem que esteja fundado na teoria que Max Weber propôs há mais de um século.